tag:blogger.com,1999:blog-34496368185241422462024-02-02T10:53:36.326-08:00ArtigosEducar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.comBlogger10125tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-84767068149130595912011-10-30T05:44:00.000-07:002011-10-30T06:05:13.387-07:00A criança chora e pais não veem - reflexões sobre o caso do garoto Davi Mota Nogueira que atirou na professora e depois se suicidou<a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjUj3bu_VTOGacJ3kKY7yspls4EhcY4I3nlnCaCwtIqqq23fdA6R_VV9O5w_SvEXi86HfImiw9az5Hdg15th0jE8FA4eJRSlmQ7TI0V_PQDRygnslYDqaut-0dgeLo9x4nONnuTc1lJKYs/s1600/Artigo+O+Popular+Caso+Davi+006.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;width: 400px; height: 251px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjUj3bu_VTOGacJ3kKY7yspls4EhcY4I3nlnCaCwtIqqq23fdA6R_VV9O5w_SvEXi86HfImiw9az5Hdg15th0jE8FA4eJRSlmQ7TI0V_PQDRygnslYDqaut-0dgeLo9x4nONnuTc1lJKYs/s400/Artigo+O+Popular+Caso+Davi+006.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5669266058548989090" border="0" /></a><br /><div style="text-align: justify; color: rgb(51, 51, 51);"><span style="font-size:130%;"><span style="font-weight: bold; color: rgb(153, 51, 153);">A criança chora e pais não veem</span><br /><br />Como muitos brasileiros, eu sofri ao saber que uma criança de apenas 10 anos atirou com uma arma de fogo contra sua professora e em seguida se matou. É profundamente desalentador perceber que uma criança tão pequena carregava em seu coração tamanho ressentimento e desesperança.<br /><br />Que mundo hostil apresentamos ao menino Davi Mota Nogueira para que ele não conseguisse depositar nenhuma esperança no dia de amanhã? Sob o impacto dessa tragédia, numa tentativa de aliviar a insuportável dor, nós adultos, tendemos a nos consolar com a idéia de que tudo foi uma fatalidade.<br /><br />Em depoimento prestado a um programa de TV, o senhor Milton Nogueira, pai de Davi, afirmou que não se sentia culpado, argumentado que o ocorrido foi uma tragédia e que só lhe resta lamentar. Ainda que imbuída de compaixão pelo indescritível sofrimento deste pai, eu me sinto na obrigação de contestar essa afirmação.<br /><br />A violência ocorrida na Escola Municipal Alcina Dantas (São Caetano/SP) – como qualquer forma de violência – poderia ter sido evitada. Diferente das catástrofes naturais, as violências são fruto de escolhas humanas, portanto, evitáveis em sua origem. Não podemos colocar uma pá nesta história, nos eximindo de nossa responsabilidade. Em honra à vida deste menino que, muito cedo, desistiu de sua vida, precisamos fazer um exercício de mea culpa, pois quando uma criança escolhe a morte algo muito errado estava ocorrendo com ela. Em um gesto de profunda humildade, autocrítica e reflexão, precisamos refazer os nossos caminhos e descobrir onde estamos fracassando como humanidade.<br /><br />Para Ronald Laing, "cada vez que nasce uma criança há uma possibilidade de adiamento. Cada criança é um novo ser, um profeta em potencial, um novo príncipe espiritual, uma nova centelha de luz que se precipita na escuridão. Quem somos nós para decidir que não há mais esperança?". Ciente da verdade proferida por Laing, acredito que cada vez que humilhamos, ferimos e matamos uma criança, estamos de fato usurpando da humanidade a esperança.<br /><br />Para as políticas públicas de saúde as violências são evitáveis. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que as violências possuem múltiplas causas e são todas evitáveis. Em sintonia com esse entendimento, acredito que múltiplos fatores contribuíram para o trágico desfecho na Escola de São Caetano. No entanto, destacarei nesse artigo apenas dois aspectos que envolvem situações de violência na escola, por considerá-los importantes fatores de riscos à saúde e a vida de crianças e jovens: o fácil acesso à arma de fogo e à aceitação social das formas violentas de lidar com conflitos e diferenças.<br /><br />ARMAS DE FOGO<br /><br />De acordo Ronaldo Cunha Lima, ex-governador da Paraíba, a presença da arma de fogo altera a natureza da violência, tornando-a letal, pois o porte de armas transforma conflitos banais em verdadeiras tragédias. Nesse sentido, levar uma arma de fogo para casa representa colocar em risco permanente a vida de crianças e adolescentes. Para Rodrigo Pimentel, especialista em segurança, não existe lugar seguro para esconder arma em casa.<br /><br />O Brasil, 3% da população mundial, é responsável por 8% das mortes por arma de fogo no mundo. 17,5 milhões é o número estimado de armas de fogo em circulação no Brasil, sendo que apenas 10% dessas armas pertencem ao Estado (forças armadas e polícias). O restante, ou seja, 90%, estão em mãos civis. O Brasil é o país onde mais se mata com arma de fogo em todo o mundo. São mais de 38.000 mortos todos os anos. Os dados do Sistema Nacional de Mortalidade evidenciam que 38,8% das causas de morte dos jovens brasileiros (15 a 24 anos) são decorrentes de armas de fogo.<br /><br />De acordo com a AACD – Associação de Assistência à Criança com Deficiência, 40,8% dos pacientes com lesão medular que procuram seus centros de reabilitação foram vítimas de armas de fogo. Esses pacientes se tornaram tetraplégicos ou paraplégicos. Mais de 83% dos pacientes avaliados pela AACD eram homens, sendo que 61% das lesões medulares por armas pertenciam ao grupo de pacientes de 12 a 18 anos.<br /><br />Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o valor das vendas de arma de fogo no país, em 2003, alcançou a cifra de R$ 344 milhões. Esse foi o movimento financeiro no mercado interno. Apesar de alto, os principais lucros alcançados pelos fabricantes de arma advêm das exportações. Relatório anual sobre transferência de armas divulgado em agosto de 2005 pelo Departamento de Pesquisa do Congresso norte-americano revelou que os dez maiores exportadores de armas do mundo venderam o correspondente a US$ 22 bilhões, em 2004.<br /><br />As cifras citadas acima mostram porque é crucial para o mercado de armas construir uma mentalidade social que tenha dentre os seus fundamentos a compreensão de que os conflitos, as diferenças interpessoais ou grupais só podem ser resolvidos por meio da violência e a edificação de um ideal de sucesso masculino centrado na idéia de dominação, de supremacia sobre o outro.<br /><br />TOLERÂNCIA À VIOLÊNCIA<br /><br />Acredito que um dos motores que faz a roda do ciclo vicioso da violência girar é o consentimento dado por nossa sociedade às formas violentas de se resolverem as diferenças, os conflitos. O uso de violências físicas na educação e no cuidado de crianças e adolescentes tem perpetuado o ciclo vicioso de violência dentro da vida familiar. Os pais batem nos filhos; os filhos batem em seus irmãos e colegas de escola; depois, filhos e colegas batem em suas namoradas, parceiras e esposas, que por fim, também batem em seus filhos. Semeamos ventos e colhemos tempestades!<br /><br />Dentre os prejuízos causados pelo uso de violências na educação e no cuidado de crianças e adolescentes, estão o desenvolvimento de uma frieza, de uma indiferença por parte dos adultos em relação à dor e ao sofrimento dos mais jovens. O principal fator que leva a aprovação do adulto de uma determinada forma de violência física ou psicológica é tê-la sofrido na infância.<br /><br />O índice de aprovação do uso de violências na educação de crianças e adolescentes é de duas a três vezes maior entre aqueles que as sofreram na infância. Os indivíduos que sofreram violências físicas rigorosas na infância tendem a crescer acreditando que suas experiências foram normais e não abusivas. Portanto, as primeiras experiências pessoais de violência podem aumentar a tolerância na hora de definir um ato como violento ou não. A tolerância em relação às violências e à crença de que o sofrimento fortalece têm promovido uma educação familiar e escolar que desvaloriza os sentimentos das crianças. A socialização pela violência tem deformado as crianças e gerado adultos com uma limitada capacidade de empatia com o outro. Nas relações interpessoais, em especial com as crianças, esse adultos não ultrapassam a margem das superficialidades, das aparências.<br /><br />Para o filósofo Theodor Adorno uma educação que valoriza o "ser duro" com os mais jovens estimula o desenvolvimento de uma cultura de indiferença em relação à dor em geral. Suportar a dor em si como um ideal de força e poder, leva ao entendimento de que é necessário perpetrar a dor no outro como um meio de fortalecimento dos aprendizes. As pessoas que são severas consigo mesmo, em nome de um suposto fortalecimento pessoal, sentem-se no direito de serem severos também com os outros, vingando-se no próximo as dores que teve que suportar calado em seu passado.<br /><br />Sem um congelamento afetivo, sem uma frieza, sem uma oceânica indiferença em relação ao sofrimento e a dor do outro a tragédia do holocausto não teria sido possível. A indiferença à dor em si e nos outros promove a naturalização da violência e o desenvolvimento de mentalidades autoritárias, como foi o caso do fascismo. Portanto, a identificação com o outro, com suas dores e amarguras, é um dos elementos cruciais para que as barbáries sejam evitadas.<br /><br />Érico Veríssimo diz que “o oposto do amor não é ódio, mas a indiferença”. Depois de 14 anos atendendo pessoas em situações de violência, tenho que concordar com a assertiva de Veríssimo. Todas as pessoas que atendi em sofrimento mental por vivenciarem alguma forma de violência buscaram ajuda. Todas tentaram comunicar a sua dor a alguém que confiava. Mesmo as crianças muito pequenas deram sinais de seu sofrimento. Mas somente uma pequena parcela não recebeu a indiferença como resposta a seu pedido de ajuda. Por expressamos um estado de entorpecimento, de frieza em relação à dor do outro, em especial das pessoas que estão mais próximo de nós, não temos protegido os que sofrem de seus próprios desatinos.<br /><br /><br /></span><div style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmwtT3NqLXN-TVEyjQTdyenr7BWLAmrZdAJJcKX26RpJYC8RS1HedjKC9_Kmdup7_ungyVWdIHqFq2SKN0IeUjpHMPA33WGStGNCTUS7Szu3NU-H8ugwgVcAKLos31jPjDc1dIyi2XFIk/s1600/Muro+pixado+em+SP%255B5%255D.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;width: 400px; height: 243px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmwtT3NqLXN-TVEyjQTdyenr7BWLAmrZdAJJcKX26RpJYC8RS1HedjKC9_Kmdup7_ungyVWdIHqFq2SKN0IeUjpHMPA33WGStGNCTUS7Szu3NU-H8ugwgVcAKLos31jPjDc1dIyi2XFIk/s400/Muro+pixado+em+SP%255B5%255D.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5669270083492715138" border="0" /></a>Muro pichado com a frase: "Criança chora, pais não vê (sic)" em 22 de setembro - São Caetano (SP). Colégio municipal viu criança de 10 anos atirar na professora e depois na própria cabeça.<br /></div><span style="font-size:130%;"><br />A frase “a criança chora e pais não vê”, pichada no muro da Escola de São Caetano, delata a nossa incapacidade de enxergar nas crianças suas aflições e sofrimentos. Embora fosse vista por muitos, como "um menino calmo, bem-arrumado, educado e branco”, ele estava em sofrimento. Ele deu pistas desse sofrimento duas semanas antes da tragédia, ao fazer a seguinte pergunta ao seu irmão mais velho: “se eu morrer você vai ficar triste?” No dia da tragédia ele contou para um colega que tinha uma arma e ia matar a professora Rose. Esse colega não levou o caso adiante, pois achou que a fala de Davi era apenas uma brincadeira. Esses dois diálogos são exemplos claros de oportunidades perdidas. Quantas outras chances foram oferecidas por Davi para que a violência contra a professora fosse evitada e sua vida salva? Bem, agora é tarde demais.<br /><br />A dor, o medo e a angustia do menino Davi não foram ouvidas, quanto menos legitimadas. Por não ouvir seus recatados pedidos de ajuda, não pudemos protegê-lo de seu desatino. As pessoas que atendi ao longo de minha prática profissional me ensinaram muito sobre os seus sentimentos em relação à violência sofrida. Elas sentem raiva e ódio do autor da violência. Mas também sentem, em demasia, a magoa – uma mágoa profunda pela pessoa que elas depositaram confiança e amor, mas que não agiram no sentido de protegê-las da violência ou interditá-las. Ou seja, se existe alguém que fere o outro, existem sempre muitos que não impediram que essa ferida fosse aberta. Se queremos ajudar as vítimas, só tem um caminho: não ser também cúmplices das violências, não negligenciar o sofrimento do outro.<br /><br />Por que pais e educadores não conseguem perceber sofrimento e dificuldades nas crianças “silenciosas” demais? Será que esse silêncio, essa calma aparente definida por professores e pais de colegas de Davi eram na verdade um estado de profundo desligamento da realidade que o fazia sofrer?<br /><br />É crucial que pais e educadores saibam que um dos importantes sinais de alerta para uma dificuldade no plano relacional e afetivo é o isolamento, o afastamento silencioso e progressivo do convívio com o outro. As vulnerabilidades e os sinais de alerta para o diagnóstico de situações de violências contra crianças e adolescentes precisam ser partilhado com pais e professores.<br /><br />Todavia, mais importante que receber informações que ajudem na identificação de situações de risco, pais e professores precisam ter como prioridade educativa a construção de uma proximidade afetiva com seus filhos e alunos. Eles necessitam de um espaço para o diálogo franco, onde possam partilhar com os adultos seus dilemas, vergonhas, angustias e dores. Pois como afirma Charles Chaplin no discurso final do filme O Grande Ditador: “mais do que de máquinas, precisamos de humanidade, mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido."<br /><br /><span style="font-weight: bold; color: rgb(153, 51, 153);">Cida Alves</span> - psicóloga do Núcleo de Prevenção das Violências e Promoção da Saúde da Secretaria Municipal da Saúde de Goiânia. Mestre em educação e doutoranda pela Universidade Federal de Goiás - UFG. Colaboradora da Área Técnica de Vigilância e Prevenção de Violências e Acidentes/ Ministério da Saúde e integrante da Rede Não bata eduque. Há quatorze anos atua na saúde pública atendendo pessoas em situação de violência.<br /><br />Fonte: Artigo publicado no caderno Magazine do jornal “O Popular”, em 2 de outubro de 2011 – Goiânia (GO). </span></div><p style="text-align:justify"><span style="font-size:130%;"><em><span style="Georgia","serif";font-family:";color:#333333;" ></span></em></span></p>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-11392881458042925132010-10-18T10:57:00.001-07:002010-11-03T11:20:29.836-07:00Velhas crendices sustentam o vicioso ciclo da violência<h2 class="date-header"><span></span></h2> <div class="date-posts"> <div class="post-outer"> <div class="post hentry"> <a name="6305835156933850556"></a> <div class="post-header"> </div> <div class="post-body entry-content"> <span style="color: rgb(255, 255, 255);">.</span><br /><span style="color: rgb(255, 255, 255);">.</span><br /><div style="text-align: justify;"><span style="color: rgb(102, 102, 102);font-size:130%;" ><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Cerca de 100 crianças morrem por dia vítimas de maus tratos no Brasil (IBGE, 1988). </span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">18 mil crianças são espancadas diariamente; ao ano, 6.570.000 (</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="color: rgb(51, 51, 51);"><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">CNBB, 1999)</span><span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);">.</span> </span>10% das crianças que se apresentam nas urgências dos hospitais brasileiros, com menos de cinco anos, são vítimas de abuso físico. Nas internações hospitalares, verifica-se elevada ocorrência de traumatismo craniano em crianças (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2004). Em 1998, foram internadas por essa causa 16.376 crianças menores de 10 anos, com predomínio do sexo masculino. Deste total, 56,8% eram menores de cinco anos, sendo representativo o número de internações em crianças menores de um ano (MELLO e SOUZA, 2004).</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Esses números evidenciam uma trágica realidade: a violência é atualmente uma das principais causas de morte e agravos a saúde entre crianças e jovens. No Brasil e no mundo ocidental, os fatores preponderantes das mortes de crianças e de jovens não são mais as enfermidades de origens biomédicas e sim o estilo de vida. Jarbas Barbosa da Silva Júnior e Horacio Toro Ocampo, na apresentação da publicação Impacto da violência na saúde do brasileiro, enfatizam que </span><span style="color: rgb(102, 102, 102);">a <span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">maior ameaça à vida das crianças e dos jovens no Brasil não são as doenças, mas sim a violência</span></span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Um elemento agrava ainda mais a situação de violência vivida por crianças e adolescentes no Brasil. </span><span style="color: rgb(0, 0, 0);">A maioria dos casos acontece dentro de casa</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="color: rgb(0, 0, 0);"> </span>e tem como principal agressor os próprios pais biológicos. A violência que afeta as crianças brasileiras ocorre predominantemente na relação familiar.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">De acordo como os resultados obtidos no Inquérito do Sistema de Vigilância em Violência e Acidentes, do Ministério da Saúde (VIVA), <span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);">em 2007, </span></span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">61 % das crianças e 92% dos adolescentes tiveram como causa principal de internação a violência física.</span> Os dados dos inquéritos realizados nos anos de 2006 e 2007 apontam que a mãe (25%) seguida pelo pai (20%) são os principais autores de violências contra crianças (0 - 9 anos de idade). Uma década antes as estatísticas inglesas já confirmavam a tendência evidenciada no inquérito do Sistema VIVA.<br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">As estatísticas de violência contra crianças e adolescentes no estado de Goiás seguem as mesmas tendências do quadro nacional e internacional. A Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) do Estado de Goiás apresenta em seu relatório de crimes apurados no ano de 2004, especificamente os que tiveram registros por termo circunstanciado de ocorrência (TCO), os seguintes dados: </span><span style="color: rgb(51, 51, 51);"><span style="font-weight: bold;">a </span><span style="color: rgb(0, 0, 0);"><span style="font-weight: bold;">soma dos crimes que tipificam mais claramente a violência física representa 53% do total</span>.</span></span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"> Os crimes eram de lesão corporal, maus-tratos e vias de fato. Os crimes que se caracterizam como violência sexual, tipificados em assédio sexual e ato obsceno, representaram 3% do total das ocorrências investigados pela DPCA em 2005. Segundo o relatório de notificações do Conselho Tutelar da Região Norte de Goiânia (registradas entre os meses de junho a agosto de 2005), 56% do total dos casos de violência são de maus-tratos e espancamentos.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Os danos, as lesões, os traumas e as mortes decorrentes da violência física contra as crianças e adolescentes têm um elevado custo social, causam prejuízos econômicos, sobrecarregam o sistema de saúde, aumentando os gastos com emergência, assistência e reabilitação. Um estudo estima que cerca de </span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro são gastos com os custos direitos da violência</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);">, essa cifra sobe para 10,5% quando se incluem os custos indiretos e transferências de recursos. O gasto com os custos diretos da violência no país supera três vezes o que se investe em ciência e tecnologia.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Sem sombra de dúvida, o maior custo é o humano, pois a violência física intrafamiliar tem destruído vidas, ferido corpos e mentes de muitas crianças e adolescentes. Ela provoca danos mentais e emocionais incalculáveis nas vítimas e em seus familiares. Apesar de estarrecedores, os números apresentados anteriormente revelam apenas a ponta do iceberg. Todavia, </span></span><span style="color: rgb(102, 102, 102);font-size:130%;" >ainda que tivéssemos estatísticas mais precisas, acredito que só alcançaremos a dimensão real da tragédia diária que atinge crianças e adolescentes no Brasil, <span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);">se nos aproximarmos de fato da dor visceral vivenciada em cada história de violência física.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Um breve e doloroso retrospecto de histórias já contadas em noticiários nacionais:</span><br /><br /></span><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjC_hSkiFTU_Oy6G3gjWkd11pB-aErKXZ9CB429dkP6727V1axpAYv1hAasfKrNAE9EMFQC_6Tkql4_sVQ-scl9F0kNSIH25shBqnSbx450YTO1EDHGBFALqfgTI39F2Dv-o-WmcRNkvuw/s1600/N%C3%A3o+quero+ver.jpg"><img style="float: left; margin: 0pt 10px 10px 0pt; cursor: pointer; width: 116px; height: 114px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjC_hSkiFTU_Oy6G3gjWkd11pB-aErKXZ9CB429dkP6727V1axpAYv1hAasfKrNAE9EMFQC_6Tkql4_sVQ-scl9F0kNSIH25shBqnSbx450YTO1EDHGBFALqfgTI39F2Dv-o-WmcRNkvuw/s200/N%C3%A3o+quero+ver.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5516561697340640370" border="0" /></a><span style="color: rgb(102, 102, 102);font-size:130%;" ><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;"><br />No interior de São Paulo,<br />um garoto de seis anos foi espancado<br />violentamente por sua mãe e padrasto<br />e depois lançado de uma ponte;</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;"><br /></span></span><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjFvM9sQwjih6FU-_lhzEDMaBrAjlKkL1ikkWmLIkBiHyzAy2iWo5GJVf_cCR3ckqCEpSVY3rmEE73tGHjfzDGJsJPcNZyU6mTkx7QjBsLe5e5tK95n1KI9Wano6wofQgIyYar_g6PjREg/s1600/n%C3%A3o+quero+ouvir.jpg"><img style="float: left; margin: 0pt 10px 10px 0pt; cursor: pointer; width: 165px; height: 108px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjFvM9sQwjih6FU-_lhzEDMaBrAjlKkL1ikkWmLIkBiHyzAy2iWo5GJVf_cCR3ckqCEpSVY3rmEE73tGHjfzDGJsJPcNZyU6mTkx7QjBsLe5e5tK95n1KI9Wano6wofQgIyYar_g6PjREg/s200/n%C3%A3o+quero+ouvir.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5516562245311976226" border="0" /></a><span style="color: rgb(102, 102, 102);font-size:130%;" ><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;"><br />Izabella Nardoni foi morta por estrangulamento<br />e jogada pela janela de um prédio de classe média,<br />em São Paulo. O pai e a madrasta foram<br />os autores deste crime;</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;"><br /></span></span><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiI7UDHzMz77RbNmBXfNy1m_o8TohQb8Op7uLxOtcIGpt8eQD-vBrv3qFe-YxRLqWQA1pf_gyQlfRd0wV3tq-EU7-wqevAdd5JTCfyKpUrBMIdpOCWNNEkQOUQ8sU-oRsmGmAKCChTteg4/s1600/morda%C3%A7a+++internacional1.jpg"><img style="float: left; margin: 0pt 10px 10px 0pt; cursor: pointer; width: 184px; height: 120px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiI7UDHzMz77RbNmBXfNy1m_o8TohQb8Op7uLxOtcIGpt8eQD-vBrv3qFe-YxRLqWQA1pf_gyQlfRd0wV3tq-EU7-wqevAdd5JTCfyKpUrBMIdpOCWNNEkQOUQ8sU-oRsmGmAKCChTteg4/s200/morda%C3%A7a+++internacional1.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5516562586321277794" border="0" /></a><span style="color: rgb(102, 102, 102);font-size:130%;" ><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;"><br /><br />Os irmãos </span><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;">João Vitor dos Santos Rodrigues, 13 anos, e Igor Giovani Santos</span><span style="font-weight: bold;"> Rodrigues, 12 anos, foram barbaramente assassinados pelo pai, contando com a cumplicidade da madrasta, na cidade de Ribeirão Pires (SP).</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Ao ler os casos de violências citadas anteriormente, a maioria das pessoas se assombra, se questiona: Que mundo é esse, meu Deus! Por que mães e pais fazem isto? Mas, comumente, essas mesmas <span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);">pessoas </span></span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">logo depois desviam o olhar ou os ouvidos dos noticiários e retornam comodamente a alimentar suas velhas crenças e atitudes de sempre</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);">, como por exemplo:</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;">Todo pai e mãe têm o poder e posse absoluta sobre os filhos;</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;">Os conflitos devem ser resolvidos no tapa;<br /><br />Nenhuma família deve ser invadida em sua privacidade;</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;">As condutas dos pais sobre os filhos são incontestáveis e estes podem e devem bater em seus filhos para estes aprenderem o que é correto;</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;">Que ao bater em seus filhos os pais nunca perderão o controle da situação;</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102); font-weight: bold;">Um pouco de violência não vai prejudicar o desenvolvimento de seus filhos, etc.</span><br /><br /><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">Bem, <span style="color: rgb(51, 51, 51);">sinto muito, mas você e eu </span></span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">não estamos inocentes nestas histórias</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="color: rgb(51, 51, 51);">,</span> pois estes pais e mães seguem as mesmas crenças que a maioria dos cidadãos brasileiros tanto defende, como as que foram citadas acima. Só o que muda é a intensidade dos atos; o princípio que gera essas crenças é o mesmo: que os fins justificam os meios. Somos nós, bem intencionados cidadãos, que alimentamos dia a dia essas crenças e damos implicitamente consentimento para que estes pais cheguem a tanto.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Os autores de violências físicas levaram ao extremo, às últimas conseqüências, provavelmente tensionados por suas dificuldades afetivas ou pelos stresses cotidianos, o que a maioria da sociedade defende. </span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">Eles são os protagonistas, os ícones de nosso trágico discurso. </span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="font-weight: bold; color: rgb(0, 0, 0);"><span style="color: rgb(51, 51, 51);">O discurso que o mundo adulto é superior, e que tudo pode em relação aos mais jovens, nos impede de interditar, logo na origem, a violência física cometida contra crianças e adolescentes</span>.</span> A generalização desse discurso protege os autores de violências e descuida das vítimas.<br /><br />Geralmente quando acontece uma situação de violência, <span style="color: rgb(102, 102, 102);">dirigimos a nossa atenção para dois personagens, o autor da violência e o sujeito que sofre a violência. No entanto, costumamos esquecer um personagem crucial nesta história: <span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);">“o amolador de faca”.</span></span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"> O amolador de faca representa todos aqueles que de forma tácita ou explicita dizem todos os dias: Faça, você pode! Você deve, é de seu direito! Não deixe barato, mostre quem manda aqui!</span></span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Acredito que </span><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">um dos motores que faz a roda do ciclo vicioso da violência girar é o consentimento dado por nossa sociedade às formas violentas de se resolverem as diferenças, os conflitos</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="color: rgb(0, 0, 0);"><span style="color: rgb(51, 51, 51);">.</span> </span>O uso de violências físicas na educação e no cuidado de crianças e adolescentes tem perpetuado o ciclo vicioso de violência dentro da vida familiar. Os pais batem nos filhos; os filhos batem em seus irmãos e colegas de escola e de rua; depois, filhos e colegas batem em suas namoradas, parceiras e esposas, que por fim, também batem em seus filhos. <span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);">Semeamos ventos e colhemos tempestades!</span></span><br /><br /><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">As pessoas que defendem a erradicação dos castigos físicos e humilhantes </span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="color: rgb(51, 51, 51);"><span style="font-weight: bold;">querem colocar uma cunha nessa roda</span>,</span> dizendo o contrário do que dizem costumeiramente os amoladores de faca: Isso não pode! </span><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Não é seu direito fazer sofre e humilhar as pessoas que você considera inferior. É intolerável o uso de qualquer forma de violência na educação e no cuidado de crianças e adolescentes.</span><br /><br /><span style="color: rgb(0, 0, 0);"><span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);">O Projeto de Lei que visa coibir os castigos físicos e humilhantes busca ampliar os direitos de crianças e adolescentes</span>.</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="color: rgb(0, 0, 0);"> </span>Por isso, sua ênfase não é na quantidade ou intensidade da violência física, mas na sua proposta de dinâmica relacional. A violência física é um meio, dentre outros, de estabelecer ou manter uma relação de domínio sobre os considerados inferiores.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">Extravagante ou recatada, a violência física sempre cumpre o mesmo papel, subjugar e controlar o outro</span>. Portanto, são inconciliáveis os métodos violentos com a educação que tem como compromisso promover o desenvolvimento e a autonomia do sujeito. </span><span style="color: rgb(102, 102, 102);">O que considero crítico no método educativo que se utiliza da violência física não é a sua intensidade, mas a sua finalidade</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);">, que é controlar e manter as ações das crianças e adolescentes por meio da dor e do sofrimento físico.</span><br /><br /><span style="color: rgb(102, 102, 102);">O que se pretende, enfim, com esse Projeto de Lei não é reduzir a intensidade da violência, mas </span><span style="color: rgb(0, 0, 0);"><span style="color: rgb(51, 51, 51); font-weight: bold;">mudar a forma, o padrão de se educar as novas gerações</span>,</span><span style="color: rgb(102, 102, 102);"> assegurando assim que crianças e adolescentes cresçam e se desenvolvam livres de práticas punitivas e disciplinares que causam dor, sofrimento e humilhação. Com a aprovação do projeto, crianças e adolescentes terão direito a mesma proteção que os adultos têm em relação à sua integridade física e psicológica.</span><br /><br /></span><a style="color: rgb(102, 102, 102);" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj96QLikSnTcFHYeFySfp2bDIEaahIyM65IXZmVMA3pbst49iavJT5o8S0CMMczf8XkYE6Cu-HqVVzjKVrSIwbbnOOJOUOMAJLBz7jzC8-Rn8utQhSb6BfsxUbPIGxbh0yF_Tx9YKbkDTw/s1600/CIDA+EM+JASDAN+2010-3.jpg"><img style="float: left; margin: 0pt 10px 10px 0pt; cursor: pointer; width: 137px; height: 174px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj96QLikSnTcFHYeFySfp2bDIEaahIyM65IXZmVMA3pbst49iavJT5o8S0CMMczf8XkYE6Cu-HqVVzjKVrSIwbbnOOJOUOMAJLBz7jzC8-Rn8utQhSb6BfsxUbPIGxbh0yF_Tx9YKbkDTw/s200/CIDA+EM+JASDAN+2010-3.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5516548354616402914" border="0" /></a><span style="font-weight: bold;font-size:130%;" ><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><br /></span></span><span style="font-size:130%;"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"><span style="font-size:100%;"><span style="color: rgb(255, 102, 102); font-weight: bold;">Maria Aparecida Alves da Silva</span><br />Mestre em educação e doutoranda pelo Programa de Pós-graduação Faculdade de Educação - UFG, psicóloga do Núcleo de Prevenção das Violências e Promoção da Saúde - SMS Goiânia e consultora da Ministério da Saúde. Há 13 anos atende na saúde pública pessoas em situação de violência.</span></span><span style="font-weight: bold; color: rgb(102, 102, 102);"><span style="font-size:100%;"><br /><br /><br /><br /><br /></span></span><span style="font-style: italic; color: rgb(51, 51, 51);">Fonte: Artigo foi publicada no Jornal "O Popular" em 02 de novembro de 2010, Goiânia - Goiás</span></span> - Brasil.<br /></div></div></div></div></div>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-42852446664286021072010-10-18T10:53:00.001-07:002010-10-18T10:53:59.851-07:00Falsa unanimidade<span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51); font-size: 180%;"></span><br /><br /><br /><span style="font-weight: bold; font-size: 100%;"><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Cida Alves*</span></span><br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiGQutOexBbKULwvTZya5eZzJUoXOcrmo2zqkvNzvWK3oKHfTjtacN572odNofni3SDwwnBOb9dIEM76oj4ZiA4IYOd6L-s4a6Jjoajsw1LqcRvCftBB3Bgt2Y3KDEYjn32NvbGfL6Hry0/s1600/cida+alves.jpg"><img style="float: left; margin: 0pt 10px 10px 0pt; cursor: pointer; width: 120px; height: 140px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiGQutOexBbKULwvTZya5eZzJUoXOcrmo2zqkvNzvWK3oKHfTjtacN572odNofni3SDwwnBOb9dIEM76oj4ZiA4IYOd6L-s4a6Jjoajsw1LqcRvCftBB3Bgt2Y3KDEYjn32NvbGfL6Hry0/s200/cida+alves.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5499771239715778242" border="0" /></a><br /><span style="font-size: 130%;">A reportage</span><span style="font-size: 130%;">m “Palmadinha Fora da Lei”, capa da revista Veja da semana passada, apresenta a</span><span style="font-size: 130%;"> falsa afirmação de que existe uma quase unanimidade na aprovação dos “tapas </span><span style="font-size: 130%;">pedagógicos”. <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Ao contrário, muitos psicólogos do desenvolvimento infantil e educadores desaconselham totalmente o uso de qualquer método aversivo (que provoque dor e sofrimento) na educação de crianças. </span></span><br /><br /><span style="font-size: 130%;">A noção do que é certo e o que é errado é uma construção cultural. A família, a escola, as comunidades religiosas são instancias mediadoras dessas noções. As primeiras aprendizagens são muito importantes na construção da identidade e do padrão comportamental e relacional de uma dada pessoa. As crianças começam a aprender sobre o certo e o errado, sobre ajuda e prejuízo desde tenra idade</span><br /><span style="font-size: 130%;"> </span><br /><span style="font-size: 130%;">Os estudos antropológicos de <span style="color: rgb(153, 153, 0); font-weight: bold;">Margaret Bacon</span> e seus colaboradores, realizados em quarenta e oito sociedades da África, Américas do Norte e do Sul, da Ásia e do Pacífico Sul, encontraram a correlação entre a prática de educação das crianças e a freqüência de crimes. <span style="color: rgb(153, 153, 0);"><span style="font-weight: bold;">Bacon</span> e seus colaboradores identificaram que as sociedades em que os pais eram predominantemente dedicados tinham freqüência mais baixa de roubo do que aquelas em que os pais eram rigorosos de um modo geral.</span> E mais, esses estudos evidenciaram que o treinamento ríspido e abrupto para a independência associava-se a elevadas taxas de crime pessoal, isto é, a atos que tinha como intuito ferir ou matar outras pessoas.</span><br /><br /><span style="font-size: 130%;">Em uma pesquisa desenvolvida por <span style="color: rgb(153, 153, 0);"><span style="font-weight: bold;">Marian Yarrow </span></span>e colaboradores algumas crianças de escola maternal foram colocadas em contato com pessoas que falavam de solidariedade, mas que não eram especialmente solidárias. Outras crianças foram expostas a adultos que não só prezavam a solidariedade como também eram prestimosos. <span style="color: rgb(153, 153, 0);">As crianças que tiveram contato com os modelos atenciosos e prestativos demonstraram sistematicamente muito mais solidariedade do que as outras. Ou seja, pais ou cuidadores prestativos e afetuosos podem ensinar às crianças desde cedo os benefícios de se levar os outros em consideração.</span></span><br /><br /><span style="font-size: 130%;">As estratégias educativas que ensinam a empatia parecem aumentar a conduta social de caráter moral e ético. Os estudos do psicólogo <span style="color: rgb(153, 153, 0); font-weight: bold;">Martin Hoffman</span> corroboram com essa hipótese. Pela autodisciplina os pais encorajam os filhos a pesarem seus desejos contra as exigências morais da situação. <span style="color: rgb(153, 153, 0);">As práticas que comunicam as conseqüências danosas dos atos da criança em relação aos outros possibilita que elas se coloquem na posição dos outros e considerem o bem-estar do próximo antes de agir. </span></span><br /><br /><span style="font-size: 130%;">Quando se empregam extensamente práticas de coação, humilhação e castigos corporais, as crianças tendem a desenvolver moralidades externas, isto é, baseadas no temor do castigo. <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Ela não deixa de realizar um ato porque compreendeu genuinamente que este é errado, mas simplesmente para evitar a punição.</span> Na ausência do punidor ela pode voltar a realizar os atos estabelecidos como inadequados.</span><br /><br /><span style="font-size: 130%;">A criança bem pequena não apreende com a clareza de um adulto a complexidade da linguagem oral, pois ainda não desenvolveu a lógica e a capacidade de abstração. As argumentações de conteúdo lógico ainda não são bem compreendidas nessa fase do desenvolvimento da criança. Por isso, <span style="color: rgb(153, 153, 0);">a comunicação não verbal deve ser um dos principais instrumentos educativos nessa fase. No entanto, é importante frisar que existem estratégias de comunicação não verbal que podem ser usadas na educação de crianças pequenas que são mais eficientes e saudáveis que o tapa. </span></span><br /><br /><span style="font-size: 130%;">Tirá-la prontamente do local ou situação de risco e comunicar por intermédio de gestos e/ou expressões faciais as conseqüências danosas de se fazer isso ou aquilo. Se posicionar na altura da criança, olhando sempre diretamente para seus olhos, dizer com uma entonação de voz firme e límpida que não pode. Em momentos de crise de choro, abraçar a criança demoradamente até que ela aos poucos consiga se acalmar. <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Essas ações e gestos são apenas alguns exemplos das inúmeras estratégias de comunicação não verbal que os pais podem utilizar na educação da criança pequena.</span></span><br /><span style="font-size: 130%;"><br />Na fase inicial de vida da criança o que mais afeta as suas aprendizagens são os exemplos, ou seja, como os pais e ou responsáveis agem ou reagem às circunstâncias da vida cotidiana. <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Não basta dizer o que é correto e ético, mas sim fazer o que é correto, principalmente com os próprios filhos. Como é possível ensinar aos filhos a não provocar ou infligir dor e sofrimento aos demais se os educamos utilizando métodos disciplinares como as ameaças, as humilhações e os castigos físicos? </span>Como ensinamos a não agredir, bater e machucar os outros se agredimos, batemos e machucamos os nossos próprio filhos para “educá-los”?</span><br /><span style="font-size: 130%;"> </span><br /><span style="font-weight: bold; font-size: 130%;"> <span style="color: rgb(153, 153, 0);">A tolerância, a afetividade, a empatia com os sentimentos das crianças, o estabelecimento de regras compatíveis com as fases do desenvolvimento dos filhos e os bons exemplos de disciplina e respeitos aos outros são os recursos mais eficientes de ensinar às crianças as noções de certo e errado.</span></span><br /><br /><span style="font-size: 130%;"> Nesse sentido, acredito que o discurso que faz apologia ao "tapa pedagógico" termina por prestar dois importantes desserviços à sociedade: valoriza um dos piores recursos “educativos” e fornece um excelente álibi para a prática da violência física na educação dos filhos.</span><br /><br /><br /><span style="font-weight: bold; font-size: 100%;">*</span><span style="font-style: italic; font-weight: bold; font-size: 100%;">Cida Alves</span><span style="font-size: 100%;"> – Mestre em educação e doutoranda pela Faculdade de Educação - UFG<br />Conselheira do Conselho Regional de Psicologia – CRP 09 GO/TO<br />Psicóloga do Núcleo de Prevenção das Violências e Promoção da Saúde - SMS Goiânia<br />Há 13 anos atende na saúde pública pessoas em situação de violência</span> <span class="post-comment-link"><a class="comment-link" href="http://toleranciaecontentamento.blogspot.com/2010/07/falsa-unanimidade.html#comments"></a></span><span class="post-icons"><span class="item-action"><a href="email-post.g?blogID=3352626887402758950&postID=3138189203173437747" title="Enviar esta postagem"> </a> </span></span>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-8934381358400703662010-01-28T06:55:00.000-08:002010-10-18T11:37:10.473-07:00Violência Física: riscos e disfunções<span style="color: rgb(255, 255, 255);">s</span><br /><br /><br /><div style="text-align: justify; color: rgb(51, 51, 51);"><span style="font-size:130%;">Este artigo dedico a esclarecer pais e cuidadores sobre os riscos que o uso do disciplinamento corporal pode acarretar no desenvolvimento físico e mental das crianças. As informações expostas neste texto se dirigem a pais biológicos ou não que concebem a educação de seus filhos como um projeto de vida, de futuro e de contentamento.<br /><br />Sabemos que educar um filho não é tarefa fácil – as dúvidas e os medos estão presentes em cada fase de seu desenvolvimento. Tenho a seguinte compreensão: são poucos os pais que receberam orientação e acompanhamento adequado para desenvolver a difícil tarefa de educar.<br />Como tudo que envolve as experiências humanas, a violência física contra crianças e adolescentes é fenômeno complexo – suas causas e usos possuem muitas origens. Para fins didáticos, dividirei em dois grupos diferentes os adultos que costumam usar as punições corporais. Os adultos do primeiro grupo utilizam as agressões físicas de forma aleatória: ocorrem, geralmente, pelo descontrole emocional, impulsividade ou algum transtorno mental associado. Nesse caso, a punição física não possui um objetivo disciplinar, mesmo que a argumentação consciente seja de melhor educar os filhos.<br /><br />Este tipo de agressor é vulnerável tanto aos elementos internos (ansiedade, depressão, frustrações etc.) como externos (stressores) presentes em sua vida (álcool, drogas, conflitos conjugais ou de trabalho e dificuldades financeiras). A violência física utilizada por este tipo de agressor se manifesta de forma mais severa. São exemplos bastante comuns as seguintes formas de agressão: queimaduras por pontas de cigarro, por objetos aquecidos, como ferros de passar roupas e talheres incandescentes; os envenenamentos; ferimentos com objetos contundentes, traumatismos craniano fraturas ósseas e etc.<br /><br />No segundo grupo estão os adultos que se utilizam de punições físicas com a finalidade disciplinar. A punição não costuma acontecer de modo aleatório. Ela ocorre quando se quer inibir ou eliminar um comportamento supostamente inadequado da criança ou do adolescente. Este tipo de disciplinamento é adotado por ser um modelo aprendido na família de origem, por crenças religiosas ou por desconhecer outras formas de se educar.<br /><br />Controle – Porém, nos dois grupos de adultos os castigos físicos estão, geralmente, associados às necessidades de controle do comportamento do outro e ao sentimento de frustração (seja em relação a uma expectativa ou a um desejo). O adulto que usa as punições físicas em seus filhos está em certos momentos susceptíveis à irritabilidade e à impulsividade. Suas reações estão normalmente afetadas por sensações e sentimentos negativos. Excitação excessiva, ira, frustração e medo provocam reações no sistema nervoso autônomo. Com isso, uma forte descarga adrenérgica pode afetar o comportamento dos pais. A adrenalina é o hormônio das ações aceleradas.<br /><br />É comum o relato de pais sobre a sua perda de controle no momento da agressão física. As pesquisas confirmam a freqüência deste descontrole. Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos, em 1993, demonstrou que entre as milhares de pessoas consultadas, um quarto delas admitiram que pelo menos uma vez perderam o controle ao castigar fisicamente seus filhos. Nas investigações de graves agressões físicas contra crianças e adolescentes muitos pais relatam que os incidentes começaram como “uma punição comum”.<br /><br />A dificuldade em controlar as reações no momento que emergem conflitos e frustrações não é a única situação de vulnerabilidade presente ao aplicarmos castigos físicos, principalmente em crianças. A segunda vulnerabilidade representa a própria fragilidade corporal da criança. A força que o adulto avalia ser pequena pode não ser para as crianças. Por isso, bater em crianças é fisicamente perigoso. As chamadas punições mais leves podem, muitas vezes, causar sérios ferimentos. Sacudir bebês, por exemplo, pode levar a concussões, danos cerebrais e até mesmo causar a morte.<br /><br />A terceira vulnerabilidade está na suposta confiança que os pais têm na eficiência da punição física como método disciplinar. Essa confiança impede os pais de verem as falhas que este modelo oferece. Assim, as punições que começam “levemente” podem evoluir para medidas mais severas. Diante da ineficiência desse método, a tendência dos pais é achar que a dose esta fraca, aumentando progressivamente a intensidade da agressão.<br /><br />Independente da finalidade, das características individuais de quem utiliza a violência como método disciplinar e das vulnerabilidades presentes, a punição física traz danos para as crianças. Os riscos para o bom desenvolvimento das crianças não se restringem somente na intensidade do castigo, moderado ou imoderado. Os riscos estão presentes na proposta do método, que é provocar dor e sofrimento físico.<br /><br />Nessa forma de disciplinamento há mensagens muito perigosas, em que se funde amor com dor, cólera e submissão: “eu te puno para o teu próprio bem, eu te machuco porque te amo”. A dupla mensagem que a punição física carrega pode levar ao desenvolvimento de disfunções preceptivas, transtornos adaptativos e comportamentos estereotipados na vida dos filhos.<br />Pesquisadores fazem o seguinte alerta: filhos de pais dominadores, coercitivos, explosivos e espancadores tendem a desenvolver uma reação complementar patológica. Ou tornam-se extremamente submissos, assustados, podendo desenvolver processos psicopatológicos graves como fobias, traços psicóticos e depressão. Ou caminham para outro extremo: rebelam-se, assumindo traços de delinqüência.<br /><br />Vivência – No trabalho terapêutico encontrei muitas mulheres que sofriam com os atos de violência do marido ou parceiro sem conseguirem se proteger ou encontrar uma alternativa de mudança para o seu padrão de relacionamento conjugal. Essas mulheres tinham, em comum, uma história de violência anterior, praticada pela família de origem. Muitas expressavam em seu comportamento submisso uma adaptação estereotipada às condutas violentas (psicológica, sexual ou física) que sofriam de seus pais ou cuidadores quando meninas. Porém, o impressionante é que elas traziam subjacentes a dor e o medo, a crença de que quem pune ou castiga com violência é porque tem sentimentos verdadeiros, porque ama.<br /><br />Pesquisas psicológicas têm demonstrado que quando há uma contradição entre teoria e prática: as crianças prestam mais atenção nas atitudes do que nas palavras. Esta pesquisa é muito evidente: é só fazer um teste: bata numa criança e simultaneamente diga por que bateu. Pergunte a essa criança agredida a razão pela qual sofreu violência. Questione-a sobre o que mais a marcou: o tapa o a mensagem? Isso se dá especialmente nos casos em que se deseja controlar um comportamento violento usando outro da mesma natureza. Diante dessas situações, é comum a criança demonstrar confusão em seus pensamentos: “como podem me amar e me ferir ao mesmo”, “como podem dizer para não batermos em outras pessoas se eles mesmos (os pais) batem”.<br /><br />Outras pesquisas dão ênfase no fenômeno da aprendizagem social da violência. Ou seja: agressão gera agressão. Elas demonstram que crianças submetidas a punições físicas estão mais propensas a agir de forma agressiva com seus irmãos e colegas; a ter condutas anti-sociais na adolescência; a ser violentas quando adultas (em seus matrimônios ou com seus filhos), a cometer crimes violentos.<br /><br />Consequências – Estudos comparativos, coordenados pelo psiquiatra da Escola de Medicina de Harvard, professor Martin H. Teicher, demonstraram que as conseqüências da violência física podem ir além das dificuldades afetivas e comportamentais. Suas pesquisas identificaram alterações na morfologia e fisiologia das estruturas cerebrais de pessoas que foram vítimas de maus-tratos em fases precoces de sua vida.<br /><br />As alterações encontradas por Teicher eram manifestações de sintomas semelhantes aos portadores do quadro orgânico de Epilepsia do Lobo Temporal (ELT). Os sintomas encontrados em sua pesquisa foram anormalidades nas ondas cerebrais no eletroencefalograma, disfunções do sistema límbico, com alterações no tamanho das amígdalas e do hipocampo; diminuição da integração entre os hemisférios direito e esquerdo do cérebro, com a presença de um corpo caloso menor que o normal, e a anormalidade na vermis cerebral, com redução do fluxo sanguíneo.<br /><br />Teicher argumenta que se os maus-tratos ocorrem durante a fase crítica da formação do cérebro, quando ele está sendo esculpido pela experiência com o meio externo, o impacto do estresse severo pode deixar marcas indeléveis na sua estrutura e função. Para ele, o abuso leva uma cascata de efeitos moleculares e neurofisilógicos, que alteram de forma irreversível o desenvolvimento neural.<br /><br />O castigo físico agrega em si o risco de muitos danos emocionais e físicos. Porém, nenhum evento isolado é o único desencadeador de uma dificuldade psíquica, pois a violência se desenha diferente em cada grupo familiar. Como pais devemos ter muito cuidado ao escolher um método de disciplinamento. Temos que ponderar as evidências cumulativas de pesquisas e dados clínicos que apontam o seguinte: a) as punições corporais oferecem um modelo inadequado, por parte dos adultos, de lidar com situações de conflitos e frustração, que é o uso da força, da violência; b) a restrição imediata de um comportamento inadequado pelo uso da dor impede pais e filhos de conhecerem as origens das dificuldades e suas motivações, ficando mais difícil a real elaboração e superação dos mesmos; c) facilita o surgimento de desvio no comportamento, como esconder ou dissimular por medo da punição física; d) o comportamento desejado só ocorre na presença do agressor, pois o controle deste se dá por coação externa e não pela aceitação íntima da criança ou adolescente; e) aparecem dificuldades na aprendizagem e na internalização das regras e dos valores de certo e errado, pois elas vêm associadas a sentimentos e sensações negativas; f) aumentam as chances de aparecer dificuldades na aceitação da figura de autoridade.<br />Diversas pesquisas apontam pontos em comum em relação a crianças vítimas de abuso físico: esses atos podem desenvolver sérios problemas emocionais, como auto-conceito negativo e baixa auto-estima, comportamento agressivo, menor rendimento intelectual, dificuldades de relacionamento com outras crianças e adultos, e capacidade prejudicada de acreditar nos outros.<br />Um bom desenvolvimento exige que os pais ou cuidadores tenham a capacidade de exercer sua autoridade, com amor e disciplina. Porém, cabe a nós, educadores e profissionais da área da saúde mental, auxiliá-los a perceber em que base se sedimenta sua autoridade e disciplina.<br /></span></div><span style="font-size:130%;"><br /><span style="color: rgb(51, 51, 51);"></span><br /></span><span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);font-size:130%;" >Cida Alves</span><span style="font-size:130%;"><span style="color: rgb(51, 51, 51);"> é psicóloga (com formação em psicodrama terapêutico e em terapia de família e casal), especialista em atendimentos de pessoas em situação de violência, mestre em Educação pela UFG e ex-secretária municipal de saúde de Bela Vista de Goiás.<br /><br /><span style="font-style: italic;">Fonte: </span></span></span><span style="font-style: italic;font-size:130%;" ><span style="color: rgb(51, 51, 51);">Artigo foi publicada no Jornal O Popular em 10 de agosto de 2006. Goiânia Goiás<br /><br /><br /></span></span>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-79681644944099386862009-11-21T14:35:00.000-08:002010-07-29T13:50:11.378-07:00Papéis conjugais e parentais na situação de divórcio destrutivo com filhos pequenos<span style="color: rgb(255, 255, 255);">.</span><br /><br /><br /><span style="color: rgb(255, 255, 255);">.</span><br /><div style="text-align: justify;">Dissertação apresentada por MARIANA MARTINS JURAS ao Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, sob a orientação da Profª Drª LIANA FORTUNATO COSTA.<br /></div><br /><span style="font-weight: bold;">RESUMO</span><br /><div style="text-align: justify;">O divórcio é um fenômeno crescente em nossa sociedade e, da mesma forma, existe um<br />aumento de ex-cônjuges que buscam a Justiça para resolver seus conflitos familiares. O<br />divórcio destrutivo refere-se a uma dinâmica familiar violenta após o divórcio, em que<br />prevalecem sentimentos agressivos entre os ex-cônjuges, incluindo terceiros no conflito.<br />O presente trabalho aborda a questão dos papéis parentais e conjugais no divórcio<br />destrutivo em que há filhos pequenos e insere-se no contexto jurídico durante a<br />realização do estudo psicossocial de famílias em processos de disputa de guarda e<br />regulamentação de visitas, especificamente no Serviço de Atendimento a Famílias com<br />Ação Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. A fundamentação<br />teórica reporta-se à Teoria Familiar Sistêmica, além de buscar aspectos do Direito<br />Crítico para complementar o arcabouço teórico deste estudo. Participaram da pesquisa<br />três famílias divorciadas que entraram na Justiça buscando a regularização judicial da<br />guarda e visita dos filhos, todos eles com menos de 12 anos idade. A pesquisa-ação<br />consistiu o método de pesquisa utilizado, a partir da metodologia de Pesquisa<br />Qualitativa, com utilização dos seguintes instrumentos: entrevistas semi-estruturadas<br />com as famílias, genograma familiar, visita domiciliar e desenho da família realizado<br />pelas crianças. A análise dos dados foi baseada na proposta de Análise de Conteúdo de<br />González Rey, com construção-interpretação de zonas de sentido. Os resultados<br />evidenciaram a dificuldade de diferenciação dos papéis parentais e conjugais pelas<br />famílias com dinâmicas destrutivas, em que a disputa conjugal perpetua-se no contexto<br />jurídico, além de ser privilegiada em detrimento dos cuidados parentais. A forma de<br />comunicação predominante entre os ex-cônjuges é a escalada simétrica, em que fatores<br />como competição, auto-promoção, destruição do outro, responsabilização do outro pelo<br />conflito, comunicação rígida, autoritária e violenta, lutas de poder, evitação de contato<br />direto com o ex-cônjuge, paradoxos e triangulações, principalmente com filhos,<br />familiares e profissionais da Justiça, estão presentes. Com relação às crianças,<br />constatou-se que elas freqüentemente são incluídas no conflito e manifestam<br />sentimentos de sofrimento e insatisfação com o conflito conjugal. Por outro lado, elas<br />evidenciaram recursos importantes para o enfrentamento desse divórcio, como o<br />fortalecimento da fratria e busca de estratégias fora do âmbito familiar. Considera-se<br />fundamental a adoção da perspectiva sistêmica para a atuação profissional com<br />dinâmicas familiares que envolvam processo de divórcio destrutivo que compreenda<br />suas complexidades, competências e contradições inerentes aos sistemas humanos.<br /><br />Palavras-Chave: Psicologia Jurídica; divórcio destrutivo; papéis parentais; papéis<br />Conjugais<br /></div><br />Universidade de Brasília<br />Instituto de Psicologia<br />Departamento de Psicologia Clínica<br />Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Cultura<br />Brasília/DF<br />2009<br /><br /><br /><span style="font-weight: bold;">CONSIDERAÇÕES FINAIS</span><br /><br /><div style="text-align: justify;">A compreensão sistêmica das dinâmicas familiares insere-se na reflexão sobre complexidade, contextualização, instabilidade, imprevisibilidade e subjetividade<br />(Vasconcellos, 2003). Não obstante, o divórcio destrutivo é um fenômeno que exige<br />uma multiplicidade de olhares, entendimentos, posturas e contextos que devem ser<br />considerados. Essas características das famílias e, conseqüentemente, do divórcio<br />destrutivo, promovem a formulação de questionamentos mais que respostas.<br /><br />Entendo que a complexidade referida não é alcançada em apenas um estudo, mas<br />a diversidade de estudos, disciplinas e visões sobre um mesmo objeto, que não está<br />isolado, contribui para esse objetivo (Böing, Crepaldi & Moré, 2008; González Rey,<br />2005). Nesse sentido, o presente trabalho é significativo para a construção de novas<br />zonas de sentido acerca do divórcio destrutivo e, assim, convido profissionais que lidam<br />com essas famílias nas diversas áreas do conhecimento a considerarem os diferentes<br />aspectos familiares, psicossociais e jurídicos presentes no divórcio destrutivo.<br /><br />O divórcio destrutivo não é um fenômeno restrito aos membros do ex-casal, pois<br />envolve diversos subsistemas familiares (parental, conjugal, filial, fraternal e<br />transgeracional) e sistemas institucionais, como é o caso da Justiça. O pensamento<br />sistêmico, proposto por Vasconcellos (1995, 2003), é uma epistemologia que contempla<br />de maneira integrada todos esses sistemas envolvidos a partir dos pressupostos da<br />complexidade, instabilidade e subjetividade. Por este motivo, a Terapia Familiar<br />Sistêmica possui recursos teóricos e práticos para o trabalho com famílias com<br />dinâmicas relacionais destrutivas na Justiça.<br /><br />Com relação ao trabalho sistêmico com essas famílias, Isaacs, Montalvo e<br />Abelsohn (2001) buscam ampliar a compreensão da dinâmica conjugal, inserindo<br />diferentes pessoas no trabalho, como crianças e adolescentes, familiares e advogados.<br />Além disso, os autores ressaltam que a promoção do simples encontro de ex- cônjuges<br />que optaram por não ter mais contato direto não é suficiente para proporcionar um novo<br />diálogo construtivo, uma vez que dificilmente eles farão isso por eles mesmos. Esses<br />autores propõem um procedimento que envolve um preparo de ambos os pais para o<br />encontro e o estabelecimento de diálogo e possíveis acordos.<br /><br />Mitcham-Smith e Henry (2007) elaboraram uma metodologia para divórcios<br />altamente conflituosos, a qual nomearam de Coordenação Parental. Segundo eles, esta<br />forma de trabalho possui as seguintes especificidades: não-confidencialidade;<br />determinação judicial; foco nas necessidades infantis; diretividade; conduzida pelo<br />coordenador; orientada para objetivos; altamente estruturada; limitada no tempo;<br />responsabilidade de oferecer uma resposta a quem determinou o trabalho. Ademais, os<br />autores afirmam que o profissional deve possuir treinamento nas áreas de mediação,<br />arbitragem e negociação para o trabalho com essas famílias.<br /><br />Nota-se que existem especificidades no trabalho com famílias de equipes<br />psicossociais na Justiça que diferem substancialmente de procedimentos<br />psicoterapêuticos e de aconselhamento (Mitcham-Smith & Henry, 2007). A diversidade<br />de metodologias existentes, inclusive a utilizada neste trabalho (Lima & Ribeiro, 2008),<br />contribui para a construção e ampliação da Psicologia Jurídica como uma área<br />psicológica autônoma e não subserviente ao Direito (Brito, 1993; Saunier, 1999).<br /><br />As metodologias propostas por Isaacs, Montalvo e Abelsohn (2001) e Mitcham-<br />Smith e Henry (2007) promovem a discussão com relação ao uso da mediação nos casos<br />de divórcio destrutivo. No Brasil, existem divergências quanto à utilização da mediação<br />nesses casos. Castro (2003) considera que a mediação é útil somente em casos simples,<br />nos quais os pais encontram-se emocionalmente estruturados, ou seja, implicados de<br />responsabilidade e desprovidos de patologia. Por outro lado, Bucher-Maluschke (2007a)<br />entende que as técnicas de mediação favorecem o estabelecimento de acordos em<br />famílias em disputa, especialmente em casos de separações conjugais, partilha de bens e<br />guarda dos filhos.<br /><br />Esse diálogo demonstra que não há resposta única com relação à mediação em<br />casos de divórcio destrutivo. Deve-se ressaltar que não existe apenas um modelo de<br />mediação, mas diferentes escolas que tratam deste assunto de forma variada e complexa<br />(Bucher-Maluschke, 2007a), além de outras formas alternativas de resolução de<br />conflitos (Azevedo, 2004; Zehr, 2008). Considero válidos os procedimentos utilizados<br />no processo de mediação, sendo que muitos deles são utilizados ao longo do estudo<br />psicossocial com famílias em conflito. Entretanto, existem diferenças cruciais entre<br />essas atuações profissionais. A principal refere-se à obrigatoriedade do estudo<br />psicossocial a partir de determinação judicial, enquanto que a mediação tem como um<br />de seus princípios básicos a voluntariedade dos ex-cônjuges em participar desse<br />procedimento (Azevedo, 2004).<br /><br />Uma das principais contribuições do presente trabalho é relativa à dificuldade de<br />diferenciação entre os papéis conjugais e parentais no divórcio destrutivo com filhos<br />pequenos. Esta é das tarefas mais complexas após o processo de divórcio, uma vez que<br />os subsistemas conjugal e parental são formados pelas mesmas pessoas, o que confunde<br />a atribuição de diferentes papéis a cada um deles (Fedullo, 2001; Magalhães & Féres-<br />Carneiro, 2008).<br /><br />Verificou-se que a disputa conjugal, pautada na escalada simétrica, é<br />evidenciada nos casos de divórcio destrutivo, cujas principais características são:<br />destruição do ex-cônjuge, responsabilização do outro pelo conflito, inclusão de terceiros<br />no conflito, comunicação violenta e evitação de contato com o ex-cônjuge. Nesta<br />dinâmica familiar, a energia dos ex- cônjuges concentra-se na disputa conjugal,<br />esquecendo-se que o ex-cônjuge é fundamental na vida do filho como pai ou mãe.<br />Nessa confusão entre os papéis parentais e conjugais, a conjugalidade ocupa posição<br />hierárquica superior à parentalidade, fazendo com que o cuidado com os filhos não seja<br />privilegiado por essas famílias.<br /><br />Esta compreensão acerca dos papéis parentais e conjugais difere da proposta de<br />Síndrome de Alienação Parental, termo que tem se destacado na Justiça e na mídia<br />brasileira. Este conceito preconiza uma tentativa de estabelecer um corte definitivo entre<br />os pais e os filhos (Gardner, 1999), apresentando uma visão simplista da realidade. As<br />famílias que foram analisadas neste estudo, evidenciaram que, à medida que buscam<br />rompimentos, elas estabelecem dependências interpessoais, principalmente entre os ex-cônjuges, o que demonstra a complexidade das relações familiares. Esse movimento<br />paradoxal é entendido pelo conceito de indiferenciação de self (Bowen, 1979). As<br />estratégias e os argumentos das famílias com divórcio destrutivo no contexto judiciário<br />não visam a finalização da relação conjugal, pois a dinâmica conflituosa e de<br />rompimento estabelecida contribui para o estabelecimento de interdependências<br />afetivas, de ações e de papéis parentais e conjugais. Esta concepção é divergente do<br />conceito de Síndrome de Alienação Parental, uma vez que este termo preconiza a idéia<br />de cortes afetivos e finalizações de relações familiares. A ótica simplista presente nesse<br />termo não abarca as complexidades e os paradoxos inerentes das dinâmicas de divórcio<br />destrutivo, em que rompimentos e interdependências estão presentes<br />concomitantemente.<br /><br />Nesse sentido, o conceito de Síndrome de Alienação Parental é uma tentativa de<br />simplificação e de recusa em olhar a complexidade e as contradições das mensagens que<br />existem na escalada simétrica. A comunicação por meio da escalada simétrica contém<br />elementos paradoxais: quanto mais se procura o afastamento, mais se criam<br />dependências (Bowen, 1979).<br /><br />Os profissionais que lidam com essas famílias no contexto jurídico devem<br />priorizar o bem-estar da criança e do adolescente e, em razão disso, privilegiar os papéis<br />parentais em detrimento dos conjugais. As questões de ordem conjugal e<br />transgeracional devem ser consideradas no divórcio destrutivo; no entanto, elas não<br />serão resolvidas na Justiça, mas em outros contextos. As decisões dos magistrados e as<br />intervenções psicossociais devem voltar-se para os papéis parentais e para o bem-estar<br />das crianças envolvidas.<br /><br />O papel da Justiça, portanto, não é resolver as questões conjugais presentes no<br />divórcio destrutivo, mas destacar os aspectos parentais para basear suas intervenções e<br />decisões. Embora haja prevalência da disputa conjugal em detrimento dos papéis<br />parentais no divórcio destrutivo, existem momentos em que as famílias discursam juntas<br />sobre a proteção e o bem-estar dos filhos. Esses pequenos momentos, que muitas vezes<br />são ignorados pelos profissionais, devem ser focalizados e ampliados, pois se entende<br />que a valorização da competência existente no seio familiar é mais eficaz no trabalho<br />com famílias em conflito (Ausloos, 1996; Castilho, 2008; Costa, 1989).<br /><br />Além das competências familiares, os profissionais devem atentar-se às vozes<br />das crianças e dos adolescentes que surgem neste contexto de decisão, onde muitas<br />vezes o “adultismo” prevalece. Freqüentemente, crianças e adolescentes são<br />menosprezados pelos adultos como sujeitos de direitos e que merecem ser ouvidos,<br />postura esta proveniente de legado histórico ainda presente em nossa sociedade (Ariés,<br />1986). Cabe aos profissionais que lidam diretamente com esta população buscar<br />desvendar suas manifestações afetivas dentro da dinâmica de divórcio destrutivo em que<br />está inserida. É primordial ter sensibilidade e conhecimento acerca do sofrimento<br />infantil, que se encontra inserido nas falas, nos desenhos e nas brincadeiras, a fim de<br />que se proporcione intervenções favoráveis ao seu desenvolvimento saudável.<br /><br />Outra questão que deve ser analisada com relação ao “adultismo” presente na<br />Justiça refere-se novamente à inserção do conceito de Síndrome de Alienação Parental<br />nesse contexto. Este termo enfatiza que a criança que manifesta esta síndrome sofreu<br />uma “lavagem cerebral” por parte do genitor alienador e que, por este motivo, sua fala<br />encontra-se contaminada pela visão deste genitor (Gardner, 1999). De acordo com essa<br />linha de raciocínio, este conceito exclui a importância da voz e do sofrimento das<br />crianças envolvidas em casos de divórcio destrutivo. Como se podem negar as vozes e<br />os sentimentos da criança se ela é o sujeito principal deste trabalho? A atuação<br />psicossocial com famílias em conflito deve ser orientada para a promoção do bem-estar<br />e adequado desenvolvimento das crianças e, portanto, elas devem ser consideradas<br />como participantes legítimos do processo de estudo psicossocial.<br /><br />Com relação ao paradigma predominante na Justiça, Bucher-Maluschke (2007b)<br />aponta a ineficácia do modelo linear de causalidades desse contexto, especialmente em<br />casos que envolvem famílias. A formalização de ex- cônjuges como partes discordantes<br />do processo judicial favorece o enrijecimento dessas famílias em uma dinâmica<br />violenta. Evidencia-se que separação dos pais em pólos divergentes no processo judicial<br />promove a desqualificação do outro genitor, culminando com o acirramento da escalada<br />simétrica presente no divórcio destrutivo.<br /><br />A busca de causalidades para o conflito, conferindo status a essas partes em<br />agressores e vítimas, culpados e inocentes, de acordo com Bucher-Maluschke (2007b),<br />estigmatiza os culpados e retira as responsabilidades dos inocentes. Dessa forma, as<br />famílias são expostas à verdadeira alienação em relação ao contexto jurídico e em<br />relação aos seus membros. Minuchin (1985) afirma que essa atribuição de culpa<br />presente no Judiciário em detrimento de uma postura voltada para as possíveis soluções<br />leva à repetição de intervenções inúteis para as famílias.<br /><br />Compreende-se que esse funcionamento da Justiça assemelha-se à dinâmica do<br />divórcio destrutivo, na medida que se estabelecem culpados e inocentes para o conflito<br />familiar. Ao longo da pesquisa-ação, evidenciou-se que os ex- cônjuges envolvidos em<br />relações destrutivas incluem terceiros que não promovem a resolução da disputa, como<br />é o caso da Justiça. A união da disputa conjugal com o paradigma regulatório<br />predominante na Justiça (Santos, 2000) contribui para a perpetuação do divórcio<br />destrutivo, completando, assim, o ciclo vicioso.<br /><br />Outro terceiro presente nesse contexto que também contribui para a manutenção<br />do conflito familiar refere-se à utilização do termo de Síndrome de Alienação Parental.<br />Este conceito pode ser considerado um terceiro de ordem médica que, freqüentemente,<br />tem sido incluído nesses casos. Considera-se que a medicalização de uma situação – que<br />é de ordem complexa, sistêmica, instável, subjetiva e relacional – paralisa a família e os<br />profissionais da Justiça em uma visão voltada apenas para os aspectos negativos do<br />divórcio destrutivo. Este conceito médico também constrói causas, culpados e vítimas,<br />que são elementos que impedem o desenvolvimento familiar para formas saudáveis de<br />relacionamento, como visto ao longo do trabalho.<br /><br />Bucher-Maluschke (2007b) questiona os vocabulários jurídico e médico, uma<br />vez que, historicamente, eles se apresentam de forma a patologisar os indivíduos e as<br />relações familiares. Verifica-se que essas nomenclaturas tradicionais, carregadas de<br />afetos negativos, ainda estão presentes em diversas outras ciências, incluindo a<br />Psicologia. Segundo a autora, esse vocabulário deve ser reorganizado a fim de se<br />elaborarem diagnósticos mais autênticos da realidade familiar estudada. A proposta da<br />Psicologia inserida no contexto jurídico é de atuação psicossocial, ou seja, os aspectos<br />sociais envolvidos são de grande relevância para esse trabalho, tanto quanto às questões<br />psicológicas e psicopatológicas (Costa & cols., aceito).<br /><br />A partir dessas considerações, a atuação profissional com famílias no contexto<br />jurídico deve ser realizada de maneira conjunta, em que podem ser contemplados seus<br />momentos de acordos, divergências e contradições. Para tanto, é fundamental o<br />estabelecimento de uma visão epistemológica de enfoque sistêmico assim como da<br />interdisciplinaridade no trabalho com famílias em conflito no contexto da Justiça (Aun,<br />Vasconcellos & Coelho, 2006; Braganholo, 2005; Bucher-Maluschke, 2007b; Lima &<br />Fonseca, 2008). O Direito Crítico também traz avanços importantes, por respeitar as<br />questões subjetivas e emancipatórias presentes nos processos judiciais (Braganholo,<br />2005; Santos, 2000). O estabelecimento desses aspectos em muito pode contribuir para<br />a quebra do ciclo vicioso entre as dinâmicas do sistema Judiciário e do divórcio<br />destrutivo.<br /><br />As críticas frente ao conceito de Síndrome de Alienação Parental realizadas ao<br />longo deste capítulo em nenhum momento negam a disputa conjugal, sua escalada<br />simétrica e os diversos aspectos relacionados ao divórcio destrutivo. As críticas<br />referem-se à utilização do conceito de Síndrome de Alienação Parental a fim de<br />responder de forma simples e causal sobre um fenômeno que não deve ser<br />compreendido dessa maneira, uma vez que esta limitação de visão potencializa de forma<br />danosa as dificuldades familiares envolvidas no divórcio destrutivo, além de eliminar as<br />complexidades inerentes dessas famílias.<br /><br />Um aspecto final que pode ser brevemente analisado refere-se à presença<br />marcante dos triângulos ao longo do trabalho: três famílias, terceiros no divórcio<br />destrutivo, três conjuntos de dados, três zonas de sentido. Essa configuração representa<br />a importância dos triângulos na análise de famílias que, segundo Bowen (1979), é a<br />base emocional de todos os sistemas familiares, e que influenciam no desenvolvimento<br />de trabalhos com essa população.<br /><br />Não há respostas prontas e simples para a complexidade do divórcio destrutivo.<br />A postura crítica e sistêmica dos profissionais é requisito necessário para a atuação com<br />famílias em situação de conflito e disputa. Para tanto, o desenvolvimento de novas<br />pesquisas que visem essa ampliação de visão é fundamental para o progresso da ciência.<br />As contribuições que visei com este trabalho são encaminhamentos de mudança<br />paradigmática a fim de que se apresentem reflexões e soluções mais eficazes para os<br />aspectos familiares violentos presentes no divórcio destrutivo.</div>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-48214938044130448752009-10-17T18:08:00.000-07:002015-01-28T04:57:35.115-08:00Violência física contra crianças: a guerra brasileira<span style="color: white; font-weight: bold;"><br /></span><br />
<div style="color: #333333; text-align: justify;">
<span style="font-size: 130%;">Quem disse que o Brasil não tem guerra? Ela existe. Ela fere e mata muita gente. O seu campo de batalha, geralmente, são os lares. É nesse território que se encontra a violência intrafamiliar. O custo social desta guerra – na maioria das vezes, silenciosa e oculta, é enorme. Dentro deste contexto, encontramos a violência física contra crianças e adolescentes. O resultado dessa guerra brasileira velada é alarmante: cerca de 100 crianças morrem por dia vítimas de maus tratos; mais de 36 mil crianças morrem por ano em decorrência da violência física – segundo dados do IBGE, de 1988.<br /><br />Os números que registram a extensão da violência física contra crianças e adolescentes em outros países também nos assustam, nos incomodam. Em um inquérito realizado nos Estados Unidos, em 1985, foi identificado que 62% dos pais utilizam agressão física com os filhos. São utilizados desde um empurrão ou tapa até o uso de armas de fogo e faca. Neste mesmo documento foi evidenciado ainda que 11% dos pais fazem uso de severas formas de violência contra seus filhos.<br /><br />De volta ao cenário brasileiro. No Brasil, de 1990 a 2000, morreram mais de 210 mil crianças e adolescentes em decorrência de acidentes e da violência física. Desse total de óbitos, 59.203 eram crianças de 0 a 9 anos de idade, 33. 512, púberes de 10 a 14 anos, e 119.203, adolescentes de 15 a 19 anos.<br /><br />Do ponto de vista da morbidade – medida pelos números das internações hospitalares – verificou-se uma elevada ocorrência de traumatismo craniano em crianças. Em decorrência dessa mesma causa foram internadas, em 1998, mais de 16 mil crianças, menores de 10 anos, com predomínio do sexo masculino – 56,8% eram menores de 5 anos, sendo bem representativo o número de internações em menores de 1 ano. De acordo com o Ministério da Saúde, 10% das crianças, menores de 5 anos, que dão entrada nas urgências dos hospitais brasileiros, são vítimas de abuso físico.<br /><br />No mundo ocidental, os fatores preponderantes de mortes de crianças e jovens não são mais as enfermidades de origens biomédicas e sim o estilo de vida. Os óbitos infantis (de 5 a 10 anos) decorrentes da violência e de acidentes passaram a ocupar o primeiro lugar nesse ranking da morbimortalidade. E mais: após o primeiro ano de idade da criança, as causas externas, como a violência física, são as principais causadoras das mortes em nosso país. Um fato que hoje requer maior atenção por parte das políticas públicas de saúde.<br /><br />História – A guerra interpessoal que é expressa na violência física cometida contra crianças e adolescentes tem as cores brasileiras: verdes e azuis arroxeados de hematomas e feridas. Mas não é uma guerra só do Brasil. A violência física é um fenômeno antigo, comum entre muitas civilizações, sendo utilizada para muitas finalidades. A Bíblia e o Alcorão representam um valioso instrumento para se demonstrar o quanto é remoto o uso da violência física como um método de “disciplinamento padrão”, adotado por adultos ao “educar” crianças e adolescentes.<br /><br />O uso da violência física contra crianças e jovens foi utilizado, ao longo da história humana, com outras finalidades, além das disciplinares e modeladoras de comportamentos. A sociedade Espartana, por exemplo, decretava a morte de crianças portadoras de deficiências físicas, pois as consideravam inaptas para a guerra. Os Cartagos, por motivações religiosas, sacrificavam as crianças aos deuses.<br /><br />No império romano, as crianças portadoras de deficiências física ou mental e do sexo feminino eram executadas. Na idade contemporânea temos mais exemplos cruéis de violência: os extermínios de crianças, pelos nazistas; a exploração, bem oculta, do trabalho infanto-juvenil.<br /><br />A violência física não é somente uma manifestação do passado. Hoje, existe ainda a prática de infanticídio, especialmente de bebês do sexo feminino entre os povos asiáticos e em algumas sociedades primitivas das Américas e da África. A castração feminina, com mutilação do clitóris, é executada nos dias atuais entre os povos africanos e em algumas famílias muçulmanas.<br /><br />Atualidade – Um exemplo de prática de violência recente e bem próximo da gente. Em Goiânia, em 2004, a imprensa local trouxe a história de uma criança que seria utilizada em um ritual de sacrifício. Era um bebê, do sexo masculino. Ele seria sacrificado, com a permissão da mãe, em uma cerimônia de magia negra, quando completasse 30 dias de vida.<br /><br />A mãe do bebê o ofereceu em sacrifício com o objetivo de recuperar o amor do namorado, pai biológico de seu filho. Graças a uma denúncia anônima, a criança foi salva. Ao saber do fato, o pai recorreu a um conselho tutelar de Goiânia. O bebê foi, então, resgatado, com vinte dias de vida, apresentando marcas de violência: mutilações corporais, como queimaduras nos pés, chibatadas nas costas e a algumas marcações em forma cruz na cabeça.<br /><br />No interior de São Paulo, outra história violenta – como inúmeras que acontecem por todos os cantos do Brasil: um garoto de 6 anos foi espancado violentamente por seus pais e depois lançado de uma ponte. A atualidade da violência física, em suas manifestações mais severas, está, portanto, nos prontos-socorros, nos noticiários, nos registros das delegacias e das entidades de proteção dos direitos infanto-juvenis.<br /><br />Ao ler os dois casos acima, a maioria das pessoas se assombra, podendo se perguntar intimamente: Que mundo é esse, meu Deus! Por que mães e pais fazem isto? Mas, comumente estas mesmas pessoas logo depois desviam o olhar ou os ouvidos dos noticiários e retornam comodamente a alimentar suas velhas crenças e atitudes de sempre, como por exemplo: todo pai e mãe têm o poder e posse absoluta sobre os filhos; os conflitos e frustrações devem ser resolvidos na porrada; olho por olho dente por dente; nenhuma família deve ser invadida em sua privacidade; as condutas dos pais sobre os filhos são incontestáveis e estes podem e devem bater em seus filhos para eles aprenderem o que é correto; que ao bater em seu filho você nunca perderá o controle da situação; um pouco de violência não vai prejudicar o desenvolvimento de seus filhos. E, por fim, que elas, pessoas de bem, não tem nada a ver com esses monstros que matam e ferem gravemente seus filhos.<br /><br />Bem, sinto muito, mas você (leitor) e eu não estamos inocentes nestas histórias, pois estes pais e mães seguem a mesmas crenças que a maioria dos cidadãos brasileiros tanto defendem, como as que são citadas acima. Só o que muda é a intensidade dos atos, a dinâmica e princípio são os mesmos. Somos nós, bem intencionados cidadãos, que alimentamos dia a dia essas crenças e damos implicitamente permissão para estes pais cheguem a tanto. Os agressores levaram ao extremo, às últimas conseqüências, provavelmente tensionados por suas disfunções emocionais e os stresses cotidianos, o que a maioria da sociedade defende. Eles são os protagonistas, os ícones de nosso trágico discurso em relação a crianças e adolescentes, nossos filhos.<br /><br />O discurso que o mundo adulto é superior e que tudo podemos em relação aos mais jovens nos impede de interditar, logo na origem, a violência física cometida contra crianças. Esse discurso nos cega, impedindo de ver o que ocorre realmente nas famílias. A generalização desse discurso protege os agressores e descuida das vítimas.<br /><br />Recordação – Lembro-me ainda e nunca esquecerei o olhar da criança de 6 anos que foi atirada da ponte pela mãe e padrasto. Na foto do menino, ilustrada em matéria jornalística, enxerguei em seus olhos uma profunda solidão. Para mim, o seu olhar interrogava: Por que ninguém me protege? No depoimento da avó do garoto, ela relatou que o neto sempre sofreu com a violência dos pais e que por um tempo tentou protegê-lo, mas não conseguiu impedir que a criança voltasse para a casa dos pais agressores.<br /><br />Acredito que, confusa com seus sentimentos, a avó se deparou com dois dilemas: 1) o medo de que o neto retornasse para a casa dos pais e fosse novamente agredido; 2) apesar do ambiente de violência familiar, a mãe detinha direitos sobre o filho e ela (a avó) não podia, nem devia, interferir em questões de fóruns íntimos. Veja como tudo acabou! Uma criança foi assassinada pelos pais, a mãe está presa, tendo hoje que conviver com a dor e a culpa de ter matado o próprio filho. Não seria o caso de “meter a colher de pau nesta história”? O final, talvez, seria diferente.<br /><br />Esperança – Essa é a guerra made in Brazil, de histórias e números entristecedores. E foi para pacificar e preservar a vida de nossas crianças e jovens que surgiu a proposta do Projeto de Lei 2.654/2003, que visa a erradicação do castigo físico de crianças e adolescentes, mesmo que com propósitos “disciplinares”. Só agora, em 2006, o Brasil consegue aprová-la em primeira instancia na Câmara Federal. Finalmente.<br /><br />A lei toca nas origens da violência física. A sua ênfase não é na quantidade ou intensidade da violência, mas na dinâmica, no padrão disciplinar que usa como recurso a agressão física, a dor corporal. Este aspecto é fundamental. O uso de agressões e abusos físicos ao educar as crianças e jovens tem perpetuado o ciclo vicioso de violência, particularmente intrafamiliar. O que se pretende, enfim, com o Projeto de Lei 2.564 não é reduzir a intensidade da violência, mas mudar a forma, o padrão de se educar as novas gerações. Nossas crianças e adolescentes, agradecidos, se tornarão muito mais felizes.</span></div>
<span style="color: #333333; font-size: 130%; font-weight: bold;">Cida Alves</span><span style="font-size: 130%;"><span style="color: #333333;">, psicóloga com formação em psicodrama terapêutico e em terapia de família e casal, especialista em atendimentos de pessoas em situação de violência, mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação/UFG e ex-secretária municipal de saúde de Bela Vista de Goiás.<br /><br /><span style="color: #333333; font-style: italic;">Fonte: </span></span></span><span style="color: #333333; font-size: 130%; font-style: italic;">Uma versão resumida deste artigo foi publicada no Jornal da Universidade Federal de Goiás em abril de 2008. Goiânia Goiás<br /><br /></span>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-82555359339137336502009-10-17T18:04:00.000-07:002010-10-18T11:44:59.817-07:00Um elogio aos pais<span style="color: rgb(255, 255, 255);">s</span><br /><div style="text-align: justify;"><span style="color: rgb(255, 255, 255);">s</span><br /><span style="color: rgb(255, 255, 255);font-size:130%;" >s</span><br /></div><div style="color: rgb(51, 51, 51); text-align: justify;"><span style="font-size:130%;">Como milhares de pessoas, assisti pela televisão às cenas da babá que espancava um bebê de 6 meses e uma crianças de 2 anos, filhos de comerciantes de Aparecida de Goiânia. Apesar de ser a violência contra crianças e adolescentes o enfoque do meu trabalho profissional, não foi fácil assistir às cenas. Muitos sentimentos me invadiram: indignação, raiva, medo, compaixão... quanta dor, revolta e insensatez habitam o mundo de nossas crianças. Porém, um fato me chamou muita a atenção ao acompanhar o depoimento dos pais na TV e nos jornais: a forma como a família lidou com a situação de violência. As escolhas que a mãe e o pai fizeram demonstraram a qualidade e a saúde deste grupo familiar. A violência imprimida nas crianças poderá deixar marcas físicas ou emocionais, no entanto, esta família deu uma lição de equilíbrio. E, com certeza, demonstraram afetos e comportamentos essenciais para o saudável desenvolvimento psíquico de seus filhos.<br /><br />A aprendizagem, particularmente nas primeiras fases do desenvolvimento humano, é desenvolvida prioritariamente por atos, comportamentos não-verbais, que demonstram os afetos implicados em uma relação interpessoal. No caso desta família, desde os primeiros indícios de agressão, os pais evidenciaram a presença de vínculos e afetos positivos em relação aos filhos. No momento em que a filha de 8 anos relata a agressão sofrida à mãe, esta repassa uma importante mensagem para a filha: que as crianças devem ser ouvidas e acreditadas.<br /><br />Imaginem o alívio desta menina, quando sua mãe confiou em suas informações, sem desconfirmar sua palavra e sem lhe colocar culpa. Muitos pais atribuem uma responsabilidade indevida às crianças, dizendo: “Você deve ter feito alguma coisa de errado, você não é flor que se cheire ou você é um fraco mesmo. Por que não se defendeu? Será que você não provocou essa situação?”.<br /><br />A mãe ouviu, não negou o fato, nem tampouco diminuiu a gravidade do relato da filha. Nos casos de violência que atendo, sempre uma pergunta ronda o imaginário das crianças: “Mas eu falei para minha mãe. Por que ela não acreditou, porque ela não fez nada para parar a violência?”<br />O pai deu significado ao que a mãe e filha trouxeram à tona e agiu. Não se deixou levar pelo tempo, pelas dificuldades do trabalho ou pelas suas obrigações profissionais. Deu prioridade absoluta à segurança de seus filhos. Foi tirar a prova, instalou um equipamento de monitoramento, que, claro, tem custo financeiro. Em 13 horas de gravação tinha a prova registrada, em vídeo, das imagens cruéis da babá.<br /><br />Neste momento, outras importante mensagens são repassadas para os filhos: que as crianças são importantes e valiosas; que a segurança dos filhos está acima de tudo, independemente do custo financeiro ou emocional; que as verdades precisam ser enfrentadas, mesmo que isso signifique dor; que não se deve calar diante das injustiças e da crueldade.<br /><br />Na minha percepção, a mais difícil mensagem foi dada pelo pai no momento da revelação da violência. Se as cenas deixaram um país ofendido, imaginem o estado do pai e da mãe. Imaginem a turbulência emocional que esses pais sofreram, tudo ao mesmo tempo: culpa, raiva, angústia, ódio, desejo de vingança. Aqui reside um importante diferencial entre o desatino e a sensatez, entre o descontrole dos impulsos e a regência autônoma e consciente dos mesmos.<br /><br />As escolhas em nossas vidas não são fáceis de ser exercidas, todas têm o seu preço e o seu valor. E o pai escolheu o amor incondicional à família. Mesmo tomado de revolta, foi capaz de pesar o que seria melhor para os seus filhos. Ele poderia ter feito justiça com as próprias mãos, extravasado sua agressividade – que, no caso, não seria de toda injustificada, pois a violência cometida pela babá não tem justificativa. Porém, ele ponderou: “Se faço isso, agora estaria foragido ou preso, portanto distante, é disso que a minha família precisa?”.<br /><br />O pai tomou sua decisão, que não foi de se calar ou se submeter à violência. Procurou a justiça. Não foi na primeira, nem na segunda porta que ele (o pai) foi ouvido e atendido em sua necessidade. Poderia, neste momento, ter desistido e pensado: “Essa justiça é uma droga, incompetente, morosa”. Não o fez e seguiu adiante. Procurou a OAB e a imprensa, munido com a prova do crime, a fita de vídeo. As imagens da violência foram, então, ao conhecimento público.<br />Não sei se o senhor João Batista Barbosa dos Santos (o pai) e a senhora Carla Fernandes Alves dos Santos (a mãe) têm a noção da importância de suas escolhas para os seus filhos e também para muitas crianças e adolescentes que sofrem com maus-tratos ou abusos neste país. Uma mensagem deixada pelos pais ficou marcada, não só para seus filhos, mas para todos nós: a mensagem da persistência e da credulidade nos valores humanos de justiça e da não-violência.<br />Vejamos, então, apesar das dificuldades que estes pais passaram no momento, tantas coisas eles puderam ensinar a seus filhos. Ensinaram de forma concreta e indubitável que suas crianças são a prioridade em suas vidas, que são confiáveis; que não precisam ser sacos de pancada ou válvula de escape de frustrações ou descontrole de ninguém; que elas não precisam esconder seus sofrimentos e medos para serem consideradas fortes; que nem sempre o caminho da justiça passa pela violência e que são amadas em cada escolha e cada ato por seus pais. Isso é tudo que meus pequenos pacientes tanto solicitam dos seus pais ou responsáveis.<br /><br />Às vezes me coloco no lugar da garota de 8 anos e imagino que ela deva ter muito orgulho de seus pais. Ela (a menina) deverá guardar em sua gaveta de lembranças os dias em que seus pais a protegeram da violência e do descontrole da babá, demonstrando que as crianças precisam de cuidado e respeito. Os pais a protegeram de seus próprios desatinos e insensatez, ensinando que os afetos mais intensos (raiva, revolta) podem estar sob uma madura e inteligente gerência. E a protegeram, principalmente, de seu maior medo infantil, o de não ser considerada importante e valorizada de forma verdadeira por seus pais.<br /><br />Sei que, às vezes, as feridas deixam cicatrizes e que a dor é intensa e parece não ter fim. Os traumas vividos podem ser superados, dependendo da forma que eles são tratados. Um importante passo para a superação é reconhecer a extensão da dor. Não negá-la ou minimizá-la. Outro passo fundamental é procurar ajuda profissional competente. Porém, cada um dará à ferida um significado para a sua vida. Alguns farão das feridas o estandarte de seu fracasso, do seu auto-conceito negativo, de sua menos valia. Outros, farão como os skatistas radicais, que consideram seus machucados como provas de coragem, vigor e superação. Ou farão como o ator Harrison Ford, que de sua cicatriz fez uma marca, um charme a mais para seus personagens de aventura. Ou ainda poderão fazer como a enamorada que aproveita de uma cicatriz de apendicite para tatuar uma linda rosa como declaração de amor ao seu muito amado.<br /><br />Sei que a trajetória emocional desta família não será fácil. Mas gostaria de deixar um elogio de conforto aos pais João Batista e Carla, que muito me comoveram e muito me enalteceram como profissional que acredita na qualidade humana. Obrigada por mim e por seus filhos.<br /></span></div><div style="text-align: justify;"><br /><span style="font-size:130%;"><span style="color: rgb(51, 51, 51);"></span></span><br /><span style="font-weight: bold; color: rgb(51, 51, 51);font-size:130%;" >Cida Alves</span><span style="font-size:130%;"><span style="color: rgb(51, 51, 51);"> - psicóloga com formação em psicodrama terapêutico e em terapia de família e casal, especialista em atendimentos de pessoas em situação de violência, mestre e doutoranda pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação/UFG e ex-secretária municipal de saúde de Bela Vista de Goiás.</span></span><br /><span style="font-size:130%;"><span style="color: rgb(51, 51, 51);"></span></span><br /><span style="font-size:130%;"><span style="color: rgb(51, 51, 51);"><span style="font-style: italic;">Fonte: </span></span></span><span style="font-style: italic;font-size:130%;" ><span style="color: rgb(51, 51, 51);">Esse artigo foi publicada no Jornal O Popular em 03 de agosto de 2002. Goiânia Goiás</span></span></div>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-29272797958270695202009-10-17T17:52:00.000-07:002010-10-18T11:45:51.093-07:00Tapa não é carinho: a violência física e a nova Lei<span style="font-weight: bold;"><br /><br /><span style="color: rgb(255, 255, 255);">C</span></span><br /><div style="text-align: justify; color: rgb(51, 51, 51);"><span style="font-size:130%;">Quando o desencanto nos rouba momentaneamente o vigor das batalhas uma boa notícia nos surpreende. Ora vejam: do Congresso Nacional, que gera a cada dia novos escândalos e acordos duvidosos, surge um dos maiores avanços em termos de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes dos últimos 10 anos no Brasil. Em janeiro de 2006, dois importantes projetos de leis são aprovadas por esta Casa, ambas relacionadas à educação de crianças e adolescentes. Essas leis, a médio e longo prazo, mudarão a trajetória do desenvolvimento e da vida de muitas crianças e jovens no Brasil.<br /><br />Uma dessas leis se refere à política de financiamento da educação brasileira, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). Outro projeto de lei, de número 2.654/03, de autoria da Deputada Maria do Rosário (RS), aprovada em primeira instância pela Câmara dos Deputados, também promoverá avanços significativos na educação de nossas crianças e jovens.<br /><br />Enquanto a primeira lei, que trata do FUNDEB, tem uma aceitação global, a segunda, que pretende erradicar o castigo físico, enfrenta resistências. Opiniões contrárias ao tema têm sido expressas na imprensa local. Porém, tenho dúvidas se a maioria da população realmente conhece, profundamente, as propostas da Lei.<br /><br />O Projeto de Lei 2.654/03 nasce de uma intensa e histórica luta de muitos profissionais e instituições que atuam na área de defesa dos direitos infanto-juvenis, no Brasil e no mundo. É uma lei polêmica. Até mesmo avançada para a nossa cultura, que infelizmente ainda adota, comumente, a violência física como modelo de disciplinamento das novas gerações. Embora polêmica, a lei teve o primeiro aval dos congressistas.<br /><br />O uso de castigos físicos na socialização das novas gerações é um fenômeno mundial e histórico. Ao longo do tempo, essa prática tem afetado crianças e adolescentes, independente de seu estágio de desenvolvimento. O número de distúrbios afetivos e comportamentais, de seqüelas físicas e mortes decorrentes do uso da violência física em crianças e adolescentes é alarmante em nosso país. No Brasil, em 1998, foram internadas por essa causa 16.376 crianças menores de dez anos, com predomínio do sexo masculino. Desse total, 56,8% eram menores de cinco anos, sendo representativo o número de internações em menores de um ano (SOUZA; JORGE, 2005). Nas urgências dos hospitais brasileiros, 10% das crianças que se apresentam com menos de cinco anos são vítimas de violência física (AZEVEDO; GUERRA, 1995).<br /><br />A realidade revelada nos números da violência física no Brasil é aviltante e fere a nossa honra, como nação. Medidas legais que alterem esta realidade são urgentes e necessárias. Vale citar um fato: os países que conquistaram avanços mais significativos na superação da prática da violência física como modelo disciplinar contaram com o suporte legal específico. O Brasil precisava, então, de uma lei que tratasse do tema.<br /><br />O Projeto de lei 2.654/2003 é fruto de uma luta coletiva e contou com o protagonismo do conceituado instituto LACRI/USP – especializado em estudos na área infanto-juvenil. Esse projeto de lei possui também o respaldo de outras conceituadas instituições, tanto brasileiras como internacionais, como a Save the Children/Suécia, o Instituto Promundo, a Fundação Xuxa Meneghel, a Organização Comunicarte e a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI). Além do apoio de diversas organizações, o projeto de lei atende as recomendações do Comitê dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU).<br /><br />Atualmente, 15 países proibiram terminantemente, por lei, os castigos físicos contra as crianças e adolescentes. São eles: Suécia (aprovada em 1979), Finlândia (1983), Dinamarca (1985), Noruega (1987), Áustria (1989), Chipre (1994), Letônia (1998), Croácia (1999), Alemanha, Bulgária e Israel (2000), Islândia (2003), Ucrânia e Romênia (2004) e Hungria (2005). Se a lei for aprovada, o Brasil integrará esta privilegiada lista. Outros 25 países estão no mesmo caminho: leis similares estão em tramitação em seus congressos nacionais.<br />O objetivo do projeto de lei brasileiro não é o de punir os pais. A sua finalidade é conscientizá-los quanto à ineficácia da punição corporal como método educativo, incentivando a busca de alternativas para estabelecer os limites na educação de crianças e de adolescentes. Ela visa ainda contribuir para a formação de um ambiente livre de violências, mais propício ao desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes.<br /><br />O Projeto de Lei 2.654 propõe alterações na Lei 8069/90, do Estatuto da Criança e do Adolescente, assim especificada: “A criança e o adolescente têm direito a não serem submetidos a qualquer forma de punição corporal, mediante a adoção de castigos moderados ou imoderados, sob a alegação de quaisquer propósitos, no lar, na escola em instituição de atendimento público ou privado ou em locais públicos” e “confere especial proteção à situação de vulnerabilidade à violência que a criança e o adolescente possam sofrer em conseqüência, entre outras, de sua raça, etnia, gênero ou situação socioeconômica”.<br /><br />Outra proposta do Projeto de Lei 2.654 é altera o artigo 1.634 da Lei 10.406, do Novo Código Civil, que passaria a ter a seguinte redação: “Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: exigir, sem uso da força física, moderada ou imoderada, que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição”.<br /><br />E mais: estabelece diretrizes para a atuação do Estado com a sociedade: “O estímulo de ações educativas para conscientizar o público sobre a ilicitude do uso da violência contra crianças e adolescentes, ainda que sob a alegação de propósitos pedagógicos; 2) A divulgação de instrumentos nacionais e internacionais de proteção dos direitos da criança e do adolescente, e 3) A promoção de reformas curriculares, com vistas a introduzir disciplinas voltadas à proteção da criança e do adolescente”.<br /><br />As leis não têm efeitos mágicos – como elixir –, que instantaneamente alteram crenças e atitudes pessoais. Porém, são instrumentos civilizatórios, que auxiliam nas mudanças sociais. Um bom exemplo: a abolição do uso da palmatória e outros castigos corporais nas escolas inglesas, em 1969. Neste mesmo ano, o homem põe os pés na lua e descobre que a Terra é azul. Por que lembro disso? É, no mínimo, estranho o ser humano: mesmo com tantos avanços tecnológicos, conquistados em tão pouco tempo, nós, humanos, continuamos ainda rudimentares no nosso desenvolvimento afetivo e relacional.<br /><br />Mas voltemos, rapidamente, aos ingleses. As fortes imagens de violência física e psicológica, aplicadas contra crianças inglesas, que o filme The Wall, do grupo Pink Floyd ilustram horror das práticas punitiva e humilhantes. Com metáforas e símbolos, o filme consegue retratar, sem erro e exagero, uma realidade. A violência estava, de fato, presente na vida dos estudantes ingleses.<br />A eliminação do castigo físico na Inglaterra não aconteceu, naquela época, sem oposição. Uma ampla reação conservadora se levantou contra as medidas que proibiam o uso do castigo físico nas escolas. Mil argumentos foram considerados, alguns com base em supostas teses científicas. Pais e professores se indignaram, manifestando publicamente sua oposição à lei que tratava do tema. Milhares de professores – muitos amorosos e querendo sempre o bem de seus alunos – não conseguiam imaginar como seria possível o processo de educação sem o uso de palmatórias ou de outros instrumentos similares.<br /><br />Hoje, qualquer pai ou mãe brasileiro, do mais rico ao mais pobre, acharia inconcebível o uso da palmatória como um método pedagógico na educação formal de seus filhos. As grandes conquistas sociais possuem uma dinâmica permanente de contraposição entre forças progressistas e conservadoras. Mas os avanços chegam! E a aprovação do Projeto de Lei 2.654 pode representar mais passo conquistado na longa caminhada que nos levam a construção de práticas educativas não violentas e humilhantes.<br /><br /><br /><span style="font-weight: bold;">Cida Alves </span>- psicóloga com formação em psicodrama terapêutico e em terapia de família e casal, especialista em atendimentos de pessoas em situação de violência, mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação/UFG e ex-secretária municipal de saúde de Bela Vista de Goiás.<br /><br /><span style="font-style: italic;">Fonte: </span></span><span style="font-style: italic;font-size:130%;" >Uma versão de Artigo foi publicada no Jornal O Popular em 25 de fevereiro de 2006. Goiânia Goiás.<br /><br /><br /></span></div>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com10tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-53715844091665185432009-10-17T17:45:00.000-07:002012-05-16T14:16:39.649-07:00As vozes que pedem eco<span style="font-weight: bold;"></span><br />
<br />
<div style="text-align: left;">
<span style="color: #333333; font-size: 130%; font-weight: bold;">"Dissestes que se tua voz tivesse força igual à imensa dor que sentes, </span><span style="color: #333333; font-size: 130%;"><br /></span><span style="color: #333333; font-size: 130%; font-weight: bold;">teu grito acordaria não só a tua casa, mais a vizinhança inteira".</span><span style="color: #333333; font-size: 130%;"><br /></span><span style="color: #333333; font-size: 130%; font-weight: bold;"><br />Há tempos - Legião Urbana</span></div>
<br />
<br />
<div style="color: #333333; text-align: justify;">
<span style="font-size: 130%;">De todas as crianças e adolescentes que atendi, guardei fragmentos de esperança e beleza. Com seus olhos compridos em direção aos brinquedos da sala de terapia, elas perguntavam meio que num rasgo de liberdade:<br /><br />_ “Posso brincar”?<br />_ “Posso gritar, mas gritar bem alto aqui na sala”?<br />_ “Não preciso falar daquilo agora, ou preciso”?<br /><br />Na vontade expressa de brincar, de sonhar, de poder ir até o limite de sua voz, sem coerção; e no desejo de não falar, sempre, de sua ferida, um importante aprendizado ficou! Essas pequenas criaturas me conduziram como terapeuta a um caminho “sagrado”: o da infância. Nesse caminho percebi que a alegria, o prazer e o encantamento seriam potentes bálsamos para a dor. Mas percebi também, que teria que suportar, sem panos quentes, a visão, o cheiro e a cor da ferida. Teria que atravessar descalça o deserto de seus dramas.<br /><br />No entanto, ao viajar pelos territórios inóspitos da criança sempre encontrava oásis de riqueza e força emocional. Nesses momentos, ficava com a sensação de que mais importante do que me levar ao reconhecimento das suas dores e aridez, as crianças queriam me mostrar o tamanho de sua força e também as vicissitudes que existiam em suas vidas. Elas lutavam para não falar só do abuso ou da violência sofrida, pois queriam que sua identidade e o seu relacionamento comigo não fosse construído somente com que estava desestruturado na sua vida e na de seus familiares. Elas queriam que as vissem “inteiras e não pela metade” (trecho da música comida da banda de rock Titãs). Lutavam como bravas por sua identidade e valorização.<br /><br />No tumulto de suas pequenas vidas, sempre me surpreendia com seus ímpetos de saúde e crescimento. E como as crianças, às vezes, eu também devaneava. Tornava tudo exato, simples e dizia para mim mesma:<br /><br />_ “Bem, a terapia está indo legal. Agora é só questão de tempo e paz. Logo suas feridas serão cicatrizadas”.<br /><br />Como é doce a fantasia! Mas a realidade não se apresentava tão simples assim. A terapia era abandonada, os responsáveis se mudavam para longe. Disputas judiciais tencionavam a mãe, que logo se afastava alegando falta de condições para o transporte. Mães que não compareciam, pais, padrastos e tios que nunca, nunca eram encontrados. Depois de uma boa dose de realidade, o óbvio se apresentava com toda a sua dureza peculiar. Não era só da criança e de mim que o rumo de sua vida dependia.<br /><br />Da mesma forma que as crianças foram impelidas a uma relação abusiva, pelos desejos e afetos inadequados do mundo adulto, dependerá deste mesmo mundo o resgate de sua infância e integridade.<br /><br />Cabe, então, a todos nós adulto – sejamos pais, psicólogos, médicos, advogados, conselheiros, jornalista etc. – uma fração de desejo e de afeto que nos movimente num sentido de proteger e cuidar da infância. Não podemos permitir que “só o acaso estende os braços a quem procura abrigo e proteção” (Há tempos - Legião Urbana). Precisamos nos comprometer com o significado que a violência vai assumir na vida da criança. Precisamos interromper o ciclo da violência, prevenindo novos abusos.<br /><br />Todas as crianças que atendi deixaram fortes marcas em mim. Com suas dissonantes vozes me fizeram um pedido:<br /><br />_ Escute-me sem julgamentos;<br />_ Não me vejam aos pedaços;<br />_ Não roube de mim o resto da minha infância, da minha vida e do que sobrou de minha família;<br />_ Suportem o meu estridente grito;<br />_ Dê-me eco, voz;<br /><br />Para que esses pedidos possam ser atendidos, precisamos nos afastar da idéia individualista de auto-suficiência profissional e nos aproximar da idéia de co-responsabilidade e co-dependência institucional. Um fenômeno tão complexo como o abuso sexual, seja ele praticado por familiares, conhecidos ou estranhos – não tem uma solução rápida e isolada. Uma intervenção com ações integradas entre vários segmentos sociais (educação, assistência social, saúde, conselhos tutelares, delegacias e juizados especiais, promotorias e organizações não governamentais) é fundamental.<br /><br />Só uma rede de cuidado e proteção – de nós firmes e de fios flexíveis – garantirá uma real competência às instituições que tem como tarefa proteger e cuidar de crianças, adolescentes e mulheres que sofrem alguma forma de violência.<br /><br />A proteção tem que ser integral, tem que envolver os familiares e a comunidade. Temos, assim, que assistir os familiares que estão envolvidos direta ou indiretamente, nos crimes sexuais. Eles também precisam de apoio e orientação.<br /><br />A indignação diante da violência, que é extremante saudável para as crianças e também para a sociedade em geral, não pode se confundida com a parcialidade burra, que ofusca a complexidade da relação abusiva de caráter sexual. Nem tampouco a justiça e a responsabilização, que são essenciais no processo de enfrentamento da violência, ser confundida com um mero movimento de revide ou de vingança.</span></div>
<br />
<br />
<span style="color: #333333; font-size: 130%;"><span style="font-weight: bold;">Cida Alves</span>, psicóloga com formação em psicodrama terapêutico e em terapia de família e casal, especialista em atendimentos de pessoas em situação de violência, mestre e doutoranda pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação/UFG.</span><br />
<br />
<span style="font-size: 130%; font-style: italic;">Fonte: Uma síntese desse artigo foi publicada no Jornal Gazete Popular em 17 de maio de 2002.</span><br />
<span style="color: #333333; font-size: 130%;">Vejam abaixo a letra inteira das músicas utilizadas nos textos:</span><br />
<span style="font-weight: bold;"><br />Há Tempos</span><br />
Legião Urbana<br />
Composição: <span style="font-weight: bold;">Dado Villa-Lobos/Renato Russo/Marcelo Bonfá</span><br />
<br />
Parece cocaína<br />
Mas é só tristeza<br />
Talvez tua cidade<br />
Muitos temores nascem<br />
Do cansaço e da solidão<br />
Descompasso, desperdício<br />
Herdeiros são agora<br />
Da virtude que perdemos...<br />
Há tempos tive um sonho<br />
Não me lembro, não me lembro...<br />
Tua tristeza é tão exata<br />
E hoje o dia é tão bonito<br />
Já estamos acostumados<br />
A não termos mais nem isso...<br />
Os sonhos vêm e os sonhos vão<br />
E o resto é imperfeito...<br />
Dissestes que se tua voz<br />
Tivesse força igual<br />
À imensa dor que sentes<br />
Teu grito acordaria<br />
Não só a tua casa<br />
Mas a vizinhança inteira...<br />
E há tempos<br />
Nem os santos têm ao certo<br />
A medida da maldade<br />
E há tempos são os jovens<br />
Que adoecem<br />
E há tempos<br />
O encanto está ausente<br />
E há ferrugem nos sorrisos<br />
Só o acaso estende os braços<br />
A quem procura<br />
Abrigo e proteção...<br />
Meu amor!<br />
Disciplina é liberdade<br />
Compaixão é fortaleza<br />
Ter bondade é ter coragem (Ela disse)<br />
Lá em casa tem um poço<br />
Mas a água é muito limpa...<br />
<br />
<span style="font-weight: bold;">Comida</span><br />
<span style="font-weight: bold;">Titãs</span><br />
Composição: <span style="font-weight: bold;">Arnaldo Antunes / Marcelo Fromer / Sérgio Britto</span><br />
<br />
Bebida é água!<br />
Comida é pasto!<br />
Você tem sede de que?<br />
Você tem fome de que?...<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer comida<br />
Diversão e arte<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer saída<br />
Para qualquer parte...<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer bebida<br />
Diversão, balé<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer a vida<br />
Como a vida quer...<br />
Bebida é água!<br />
Comida é pasto!<br />
Você tem sede de que?<br />
Você tem fome de que?...<br />
A gente não quer só comer<br />
A gente quer comer<br />
E quer fazer amor<br />
A gente não quer só comer<br />
A gente quer prazer<br />
Prá aliviar a dor...<br />
A gente não quer<br />
Só dinheiro<br />
A gente quer dinheiro<br />
E felicidade<br />
A gente não quer<br />
Só dinheiro<br />
A gente quer inteiro<br />
E não pela metade...<br />
Bebida é água!<br />
Comida é pasto!<br />
Você tem sede de que?<br />
Você tem fome de que?...<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer comida<br />
Diversão e arte<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer saída<br />
Para qualquer parte...<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer bebida<br />
Diversão, balé<br />
A gente não quer só comida<br />
A gente quer a vida<br />
Como a vida quer...<br />
A gente não quer só comer<br />
A gente quer comer<br />
E quer fazer amor<br />
A gente não quer só comer<br />
A gente quer prazer<br />
Prá aliviar a dor...<br />
A gente não quer<br />
Só dinheiro<br />
A gente quer dinheiro<br />
E felicidade<br />
A gente não quer<br />
Só dinheiro<br />
A gente quer inteiro<br />
E não pela metade...<br />
Diversão e arte<br />
Para qualquer parte<br />
Diversão, balé<br />
Como a vida quer<br />
Desejo, necessidade, vontade<br />
Necessidade, desejo, eh!<br />
Necessidade, vontade, eh!<br />
Necessidade...Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3449636818524142246.post-89752874251847727652009-10-17T17:07:00.000-07:002010-10-18T11:46:56.012-07:00Avesso do avesso<div style="text-align: justify;"><br /><div style="text-align: justify; color: rgb(51, 51, 51);"><span style="font-size:130%;">Pergunta do Jornal “O Popular”: </span><span style="color: rgb(153, 0, 0); font-weight: bold;font-size:130%;" >Justiça acertou na pena aplicada à ex-babá agressora?</span><span style="font-size:130%;"><br /><br /><br /><img style="margin: 0pt 0pt 10px 10px; float: right; cursor: pointer; width: 370px; height: 277px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhPq9UX_NYZjNi9vLpJ6ZfkO5HmlLLlvSboPkhpWaE2VBWEhyphenhyphenx6iLS0z_2zM-tAFKzsiTColBjbrOQ4VlOeaNPVswWK0cBwHAHYxow2ksF2WxRoKWuVFAfNn7en_Yta0wQbg3kb2wSxzmU/s400/FLOR.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5393733805647999666" border="0" />Em 1870, em um pequeno condado dos Estados Unidos da América, uma menina com o nome de Mary Ellen sofria com os ataques de fúria de seus pais. Inconformada com a intensidade dos maus-tratos empregados em Mary Ellen, a comunidade religiosa local resolve procurar as instancias jurídicas para que as crueldades fossem interditadas. Os vizinhos de Mary Ellen pesquisaram todas as leis da época. Porém nenhuma garantia proteção e segurança à menina.<br /><br />Como não dispunham de leis que pudessem protegê-la de seus agressores, a comunidade sensibilizou os membros da Sociedade Protetora dos Animais para que estes intercedessem a favor da menina, pois para os animais existiam leis de proteção contra as crueldades humanas. Com a alegação de que a criança também pertencia ao reino animal, foi possível então intervir junto à família a fim de inibir os seus comportamentos violentos.<br /><br />O embaraço causado por esta situação deu origem à constituição, em 1871 da Sociedade de Prevenção da Crueldade Contra as Crianças (SPCC) – em menos de dez anos já existiam 34 sociedades como esta somente nos EUA. E foi pelo avesso que surge no mundo uma das primeiras organizações de proteção de crianças e adolescentes que sofrem por maus-tratos. A pequena Mary Ellen, precisou se retirar, perante a lei, da sua condição humana e passar para a de animal irracional para que pudesse ser protegida.<br />Hoje, 131 anos depois do famoso caso Mary Ellen, a legislação brasileira e seu código penal, revelam sua fragilidade e impotência como instrumento de proteção de nossas crianças e de punição dos respectivos agressores. No caso da ex-babá Divina Elaine Leite, 27 anos, após a definição da penalidade da agressora, dois comentários veiculados no jornal “O Popular” (dia 22 de agosto) me intrigaram. Um foi proferido pelo promotor de justiça, o senhor Spiridon Nicofotis Anyfabtis que dizia “ficou de bom tamanho, diante das provas”. Ele salientou ainda que o fato poderia ter sido mais grave, pois as crianças não sofreram lesões sérias. Fica então alguns questionamentos: Os critérios de gravidade para a lei contemplam apenas as seqüelas físicas? Quais provas seriam necessárias para evidenciar a gravidade do ato violento? O que está implicado na concepção de gravidade da lei?<br /><br />A gravidade atribuída a uma violência não deveria ter como critério apenas as conseqüências e agravos físicos. É um grande equívoco deixarmos de lado a intensidade e a extensão da dor emocional, ao caracterizamos um ato violento. Medir a gravidade incluindo seqüelas emocionais e morais, além dos sinais de danos físicos é importante avanço. Porém, não é suficiente para dar significado ao sofrimento da vítima de violência. Pois, para quem sofre a violência, independemente, do surgimento de seqüelas imediatas ou futuras, a própria experiência de ter sido violentado já é em si grave e traumática.<br /><br />Outro comentário – do juiz da Comarca de Aparecida de Goiânia – também me fez refletir sobre a penalidade imposta a ex-babá Divina Leite: “Os parlamentares deveriam fazer leis mais severas, e que embora aparentemente pequena (a penalidade) tem cunho de ressocialização”.<br /><br />Em alguns casos é necessário uma severidade maior. Como em casos de agressores que possuem graves transtornos de personalidade e de conduta. Severidade é importante como um fator de inibição de novos comportamentos ou repetição de atos lesivos à integridade humana. Mas além do rigor da penalidade é necessário que a punição seja um dos caminhos e não o único. E que a severidade não seja compreendida como o retorno de práticas desumanas, com a visão do “olho por olho, dente por dente”. Práticas essas que não diminuem a incidência da violência, mas pelo contrário refina e intensifica os atos violentos. Para isso, uma série de outras medidas podem atuar nos fatores geradores ou facilitadores do comportamento violento. A aplicação de penas alternativas é um avanço no sistema penal brasileiro. Mas será que é pertinente no caso da ex-babá Divina Leite? Será que esta medida é capaz por si só de ressocializá-la?<br /><br />A jovem mãe Divina Leite realmente conseguiria alterar suas atitudes e valores com uma pena alternativa dessa natureza? Até o momento, pelo menos aparentemente, esta senhora não esboçou, em seu depoimento um momento de reflexão sobre o seu comportamento. Não tentou reparar o que tinha feito com as crianças. Pelo contrário, jogou a responsabilidade das violências para a mãe, no momento em que diz que avisou que não gostava de cuidar de crianças. Não se colocou em instante nenhum no lugar da mãe ou das crianças. Não expressou compreender que era incorreto sua conduta com as crianças, mesmo que seja por um valor moral, legal ou religioso. Negou diante das câmaras que bateu nos meninos. Não expressou vergonha ou constrangimento diante das câmaras. Não externou medo das companheiras de cela que ameaçava agredi-la (ela disse que enfrentaria todas). Não demonstrou preocupação com o estado de seu filho se ficasse presa. Não expressou arrependimento por que fez com as crianças. E especialmente, não expressou compaixão por sua própria situação e pela das crianças.<br /><br />O comportamento violento em casos graves tem um caráter compulsivo, ou seja, fora do controle da própria pessoa que o expressa. Na maioria dos casos, o agressor comete a violência, mas sente culpado, humilhado e impotente por não ser capaz de controlar seus impulsos e sua agressividade. Nestes casos mesmo que o sujeito queira evitar ele não consegue sozinho. É como o alcoolista que tenta parar de beber e não consegue. Estes precisam de ajuda profissional e suporte emocional e social. Para estes, as penas alternativas, acompanhadas de suporte social e de tratamento psicológico e psiquiátrico, são eficazes e eficientes. Mas a eficiência diminui em muito nos casos que o agressor não consegue sentir e entender como violento os seus atos lesivos.<br /><br />Portanto, algo está pelo avesso neste desfecho do caso da babá que agrediu os filhos de Carla Fernanda Alves dos Santos e de João Batista. Então pergunto: após oito meses a pena alternativa alteraria as dificuldades encontradas no plano emocional, relacional e de valores da Divina Leite. Talvez ela não cometa violência com os filhos dos patrões, mas como trataria ou trata o seu próprio filho. Como ela tem se tratado? Será que, com a possível dificuldade de encontrar emprego depois de tudo que aconteceu, com a conseqüente instabilidade financeira e discriminação social suportaria manter ou cuidar de seu filho? A justiça se preocupou com o filho de Divina Leite? Afinal, nesta estória todas as crianças envolvidas precisam de proteção. A justiça se preocupa com o cheiro de impunidade que paira no ar? E a família que investiu tanto na Justiça, será que em outra situação acreditará nos caminhos da lei? Uma medida tão significativa como a pena alternativa pode ser vista pela população como um triunfo do agressor e da violência? Será que a Divina Leite passará de agressora a vítima, ao tentar acionar na justiça trabalhista os pais das crianças? Será que a aplicação desta penalidade não coloca Divina Leite em risco, pois a população pode se revoltar e fazer justiça pela próprias mãos?<br /><br />Por que, para a nossa legislação brasileira, os crimes contra o patrimônio (como os bens econômicos ou naturais) têm penalidades mais severas do que os crimes contra a infância? Não são os nossos filhos, sejam crianças ou jovens, o nosso maior patrimônio.<br /><br /></span><span style="font-size:130%;"><br /></span><span style="font-size:130%;"></span><span style="font-weight: bold;font-size:130%;" >Cida Alves</span><span style="font-size:130%;">, psicóloga com formação em psicodrama terapêutico e em terapia de família e casal, especialista em atendimentos de pessoas em situação de violência, mestre e doutoranda pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação/UFG e ex-secretária municipal de saúde de Bela Vista de Goiás.</span><span style="font-size:130%;"><br /><br /></span><span style="font-style: italic;font-size:130%;" >Fonte: Uma versão resumida deste artigo foi publicada no Jornal O Popular em 01 de setembro de 2002. Goiânia Goiás</span><span style="font-size:130%;"><br /><br /><br /></span><br /></div><br /></div>Educar Sem Violênciahttp://www.blogger.com/profile/04114708337206789223noreply@blogger.com0